São Paulo, sábado, 09 de outubro de 2010

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Medidas do governo, como o aumento do IOF, conseguem impedir a valorização do real?

NÃO

Medida é remédio inócuo

ROBERTO LUIS TROSTER

Uma preocupação angustia o empresariado: é o processo de desindustrialização no Brasil.
Há consenso de que a indústria estrangeira, especialmente a chinesa, está ocupando espaços que poderiam ser da brasileira. Há um deficit comercial crescente de produtos industrializados.
Embora haja divergências quanto à intensidade do problema em cada setor, ele existe e é grave, pois sua reversão é onerosa e demorada.
O diagnóstico mais levantado é o de que o país tem a doença holandesa.
O nome vem do que aconteceu na Holanda na década de 1960; com o aumento das exportações de gás, a moeda de lá, o florim, se valorizou e inviabilizou a indústria local na época. Como o real está se valorizando pela exportação de commodities (soja e minério de ferro), há muitas comparações entre as duas situações.
É o diagnóstico mais aceito, e a prescrição é clara: desvalorizar o câmbio. Para isso, o governo acaba de elevar o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). Estão analisando o problema com olhos de meio século atrás.
Hoje, o mundo é outro: a capacidade do governo de determinar a taxa de câmbio com o IOF é reduzida e pode ter efeitos colaterais. O diagnóstico correto é outro: o que a indústria brasileira tem é a "doença colonial portuguesa".
Portugal, para garantir o controle na exploração econômica do Brasil, utilizou-se de regulamentação rígida e fiscalização severa.
A influência dos colonizadores ainda se faz sentir com a "doença colonial portuguesa": um exagero de leis, decretos, atos normativos, impostos, taxas, alvarás, registros, cartórios, guias e fiscalizações, que oneram desnecessariamente a atividade produtiva.
Para conviver com a doença, o Brasil tem 421.899 advogados, mais que o total de médicos para cuidar de todas as demais enfermidades.
A esse número devem ser acrescentadas centenas de milhares de servidores do Judiciário, de funcionários públicos, de empregados de cartórios, de fiscais e de despachantes para auxiliar na observância da lei. Mesmo assim, o número é insuficiente: atualmente, há 86,6 milhões de ações em andamento no Judiciário, e a quantidade aumenta a cada ano.
Comparações internacionais mostram que o Brasil está entre os melhores do mundo em sofisticação empresarial, em capacidade de inovar e em tecnologia e entre os piores em rigidez da regulamentação, em burocracia e em entraves empresariais.
Um caso emblemático é o do tempo para começar uma empresa: o Brasil está na 135ª posição, num total de 139 países. Um empreendedor que quer começar a produzir, pagar impostos e empregar é sufocado, aqui no país, pela doença colonial portuguesa, enquanto a indústria do resto do mundo vai ganhando terreno.
Os sintomas da doença são a pressão de custos e a rigidez.
Numa economia cada vez mais sem fronteiras, reduzir despesas e adaptações rápidas são condições necessárias para usufruir os seus benefícios.
Alguns paliativos, como barreiras temporárias e créditos subsidiados, podem retardar o processo de desindustrialização, mas uma reversão permanente exige a cura da doença colonial portuguesa. O remédio é a modernização do quadro institucional brasileiro.


ROBERTO LUIS TROSTER, 59, da S/A M, é doutor em economia pela USP e foi economista-chefe da Febraban, da ABBC e do Banco Itamarati.

E-mail: robertotroster@uol.com.br.

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