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TENDÊNCIAS/DEBATES
A Comunidade Ibero-Americana
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Somos favoráveis a uma aliança estratégica global na produção de fontes renováveis de energia, limpas e acessíveis
OS CHEFES de Estado e de governo ibero-americanos se
reunirão em Santiago (Chile)
para aprofundar o debate e avançar
propostas sobre tema de grande atualidade: o papel das políticas públicas
no fomento da coesão social. Num
mundo onde a lógica dos mercados
globalizados e a velocidade das transformações tecnológicas questionam a
eficácia de políticas públicas, é preciso reafirmar o compromisso de nossa
comunidade com os valores da solidariedade e do bem-estar coletivo.
A experiência amarga dos anos 80-90 deixou uma lição dura, porém fundamental. Desemprego, pobreza, disparidades econômicas e sociais requerem, sem dúvida, respostas economicamente consistentes. Mas as
soluções precisam ser socialmente
justas. Só um Estado democrático pode articular essas duas dimensões.
Esse tem sido o desafio da Comunidade Ibero-Americana. Na América
do Sul, vivemos a consolidação de
nossas democracias, com a crescente
participação de segmentos historicamente marginalizados que demandam urgentes ações governamentais
que atendam suas reivindicações.
A resposta do governo brasileiro
combina estratégias que muitas consideravam incompatíveis. Estamos
acelerando o crescimento com medidas de distribuição de renda e geradoras de inclusão, mas sem renunciar a
uma conduta macroeconômica responsável. Ao consolidar uma ampla
rede de proteção social para os mais
vulneráveis, estamos formando novos cidadãos e consumidores.
Os resultados são auspiciosos: crescimento sólido, inflação baixa, expansão do mercado interno com aumento do consumo popular e do crédito,
ampliação do emprego e da renda dos
trabalhadores e redução da pobreza e
das desigualdades. O programa Bolsa
Família beneficia 11 milhões de famílias, mas, além de combater a miséria,
garante, como contrapartida, a freqüência escolar, a vacinação infantil e
o acompanhamento pré-natal. O
acesso à educação e à saúde abre perspectivas para a construção de vidas
dignas e produtivas.
Por essa razão, meu governo está
empenhado em assegurar educação
pública de acesso universal e bom nível. Essa é uma ferramenta crucial para dar igualdade de oportunidades e
criar chances de ascensão social. Queremos valorizar os professores, melhorar sua formação e aumentar seus
salários. Por isso, estamos construindo mais e melhores escolas, sobretudo técnicas.
Estamos cientes de que o Estado,
sozinho, não pode superar os problemas de uma marginalização arraigada. Essa tarefa requer parceria com
diferentes setores da sociedade civil:
empresas, sindicatos, ONGs, universidades e igrejas. Na esfera internacional também: esforços nacionais
precisam ser complementados por
ações e metas globais.
É preciso um novo paradigma que
reconheça não haver "paz sustentável" sem garantia de empregos, oportunidades de desenvolvimento e confiança no futuro para todos, sobretudo os mais pobres. Somente assim encontraremos respostas às verdadeiras ameaças globais -a pobreza extrema, a violência, os extremismos, a
mudança climática.
Poderíamos começar essa parceria
pelo desafio da segurança energética.
Somos favoráveis a uma aliança estratégica global na produção de fontes
renováveis de energia, limpas e acessíveis. Os biocombustíveis têm forte
impacto social, geram empregos,
criam renda e evitam o empobrecimento rural e a urbanização desordenada. Em um mundo preocupado
com a degradação ambiental e os altos preços do petróleo, podemos reduzir emissões de gases poluentes e a
dependência de combustíveis fósseis
importados. Teremos uma equação
energética mais democrática, que beneficiará agricultores em um grande
número de regiões pobres.
A promessa do etanol e do biodiesel
só se realizará num ambiente internacional livre do protecionismo. O
comércio internacional tem todas as
condições de ser um fator de distribuição mais eqüitativa da renda mundial e da inclusão social. E é por isso
que o Brasil e seus parceiros do G20
apostam na Rodada Doha da OMC.
Desmontando os subsídios agrícolas
que distorcem o comércio, criaremos
oportunidades para milhões de trabalhadores rurais se transformarem em
fazendeiros prósperos.
Por meio da Ação Internacional
contra a Fome e a Pobreza, estamos
promovendo mecanismos financeiros inovadores de financiamento ao
desenvolvimento -resultado dela, a
Central de Medicamentos ajudará a
enfrentar a Aids, a malária e a tuberculose nos países pobres.
Um mundo mais próspero, justo e
solidário dependerá das ações que tomarmos hoje, na esfera nacional ou
por meio da concertação multilateral.
É isso que a Comunidade Ibero-Americana está fazendo. E é isso que o
mundo espera de nós.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, 61, é o presidente da República Federativa do Brasil.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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