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ROBERTO MANGABEIRA UNGER
Como pode mudar
Como pode o Brasil mudar o curso continuísta e empobrecedor
que está seguindo? Como pode salvar-se da onda de mediocridade em que se
está afogando e começar a tornar-se o
que desesperadamente quer ser: dínamo de energia construtiva, capaz de
gerar inovações surpreendentes?
Comparo três teses a respeito da saída.
A primeira tese é apelar aos governantes para que mudem de idéia. Não
acontecerá. O presidente e seus tenentes exercem-se num método que, dentro das regras políticas vigentes, só
abandonarão a pauladas: mostrar aos
financistas que são confiáveis, mostrar aos pobres que não se esqueceram
deles, mostrar aos magnatas da mídia
e aos financiadores de campanha que
sabem ser gratos e exigir gratidão e
mostrar a todos, por meio de uma política exterior em muitos pontos acertada, que não são tão vira-casacas
quanto parecem. Só crise econômica
que ameace o governo com derrota
eleitoral o demoverá desse rumo.
A segunda tese é construir, primeiro
na sociedade civil e depois na política
partidária, alternativa produtivista,
democratizante e moralizadora ao
projeto tucano-petista, alternativa que
não se deixe confundir com esquerdismo sectário ou corporativista e que
retome a evolução histórica do antigo
trabalhismo brasileiro. É factível e indispensável, ainda que penoso. Obra
de longo fôlego, não pode, porém,
surtir efeito imediato.
A terceira tese é mudar e abrir, desde
logo, a situação, reconstruindo a natureza dos partidos e a relação entre política e dinheiro. E isso se faz com iniciativas de duas ordens. De um lado,
engajando procuradores, juízes e o
que nos sobra de jornalismo independente na investigação do emaranhado
de transações que acumpliciam o poder com os financiadores dos políticos
e dos partidos. E, de outro lado, de
maneira mais profunda e definitiva,
reformando as regras eleitorais.
Comissão especial da Câmara dos
Deputados acaba de aprovar duas
propostas que, juntas, revolucionariam a política brasileira. Uma assegura o financiamento público das campanhas eleitorais e proíbe o financiamento privado. A outra institui o sistema de listas fechadas, pelo qual o
eleitor em eleições legislativas vota em
chapa partidária em vez de votar em
candidato. A votação de cada partido
determina quantos candidatos ele elege e a ordem na chapa decide a precedência entre eles.
Ambas as propostas se prestam a
abusos por oligarquias partidárias e
exigem fiscalização constante. Combinadas, porém, prometem instaurar no
país regime de partidos fortes e abafar
a voz do dinheiro. A experiência de
outras nações é inequívoca: essas reformas transformam a vida pública.
No ambiente que ajudariam a criar,
teriam vez as forças - sejam governistas ou de oposição - que querem
ver o Brasil reorientado.
Não se deve subestimar a dificuldade de aprovação dessas reformas pelo
Congresso. Entretanto sua tramitação
até agora exitosa, a despeito dos riscos
que trazem para os que se elegeram
pelas regras atuais, é um dos fatos
mais alentadores ocorridos na história
recente do país - fruto só de consciência, de convicção, de esclarecimento. Distantes do dia-a-dia do brasileiro e de difícil entendimento popular, abrem espaço para fazer política
de verdade no Brasil. Significam mudança já.
Roberto Mangabeira Unger escreve às terças-feiras nesta coluna.
www.law.harvard.edu/unger
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