São Paulo, quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

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Planalto sem energia

Setor elétrico se avizinha de limiar de risco similar ao do apagão de 2001; governo não pode fazer milagre, só lição de casa

A ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), por meio de seu presidente, Jerson Kelman, acendeu a luz amarela: o setor de energia precisa começar a se mexer, ou ser mexido. Não pode mais se limitar a manter um olho nas nuvens e outro no nível das represas das hidrelétricas. Assim acabou o ano de 2000 e começou o de 2001, que trouxe o inesquecível apagão.
Kelman vocalizou o que o governo Lula até então se recusava a admitir de modo aberto: "Não é impossível ter [racionamento em 2008]". Disse ainda que ele parece mais improvável do que provável, mas escolheu a palavra certa para chacoalhar a inércia e chamar à razão. O país precisa se preparar para a escassez de eletricidade, se de fato ela vier.
A própria Aneel não pode eximir-se de responsabilidade, por omissão diante do que muitos vêem como imperfeições do modelo elétrico. É do governo, porém, que se aguardam sinais de racionalidade e ação preventiva.
Visto do Planalto, o Ministério de Minas e Energia (MME) parece ter outras prioridades. Questões impertinentes ao setor elétrico, como as emissoras de rádio de Edison Lobão Filho (DEM-MA), suplente do senador Edison Lobão (PMDB-MA), cotado para a vaga ministerial.
Não fosse por isso, talvez o MME, a Casa Civil e a Presidência estivessem cuidando de providências óbvias, como retomar campanhas para aumentar a eficiência do consumo de energia. A poupança que se pode obter pelo lado da demanda é limitada, seguramente menor que em 2001, mas não desprezível. Não há, de resto, medidas milagrosas para gerar milhares de megawatts do dia para a noite.
Por outro lado, seis anos depois do desastre, o sistema elétrico se encontra mais bem equipado para enfrentar a escassez que virá, se continuar chovendo pouco. Há mais interligação entre as regiões, o que permite transferir energia do Sul e do Sudeste para o Nordeste, onde os reservatórios mais se acercam do nível crítico. Mal ou bem, há um parque emergencial para geração termelétrica, inexistente em 2001.
É só por isso que não subsiste razão para pânico. A crescente incerteza decorre sobretudo da prostração do governo Lula diante do que precisaria estar sendo providenciado para a travessia dos próximos três anos, enquanto grandes hidrelétricas não entram em linha e não se regulariza a oferta de gás natural.
Quase nada se expandiu, nos últimos cinco anos, a rede de dutos para distribuir gás. Os programas de conservação de energia (Procel) e fontes alternativas (Proinfa) são pouco mais que enfeites ecologicamente corretos. Pouco se aproveita do potencial eólico no Nordeste ou da geração com biomassa (bagaço de cana) no Sudeste, por falta de regulamentação e preços compensadores. Há muito a fazer.
De nada adianta o governo federal sonhar com o grau de investimento ainda neste ano se não se mostrar capaz de prover a economia com um insumo tão básico quanto eletricidade. O racionamento de energia já começou, mas no Planalto.


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