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IGOR GIELOW
A pergunta que falta
BRASÍLIA - De tempos em tempos, a discussão sobre a legalização
do aborto ressurge. Geralmente, some logo, pois de um lado há preguiça política e, do outro, mistificações
contaminam argumentos. Não nos
falta histeria de bispos e feministas.
Tomara que isso mude.
Após falar ligeirezas, o ministro
José Gomes Temporão (Saúde)
acerta ao defender o debate em termos de saúde pública, mas escorrega ao achar que o debate pode embasar um plebiscito. Primeiro, porque estamos no Brasil. Ou alguém
vê TVs abertas e rádios, únicas fontes universais de informação do
país, dispostas a bancar tal discussão de forma esclarecedora?
Bastaria a idéia surgir para o
lobby religioso apontar a ação "contra a vida", a despeito do fato de que
os cerca de 1 milhão de abortos ilegais anuais, cuja segurança decresce com a renda, seguirão ocorrendo.
Aqui, se apoiar a mudança na lei,
você é "a favor do aborto".
Ora, ninguém que fez aborto o
aprova como recurso corriqueiro,
nem ele é visto como uma opção
contraceptiva. É um extremo. É um
episódio fisicamente traumático e
psicologicamente arrasador.
Hoje, a mulher que se arrisca a fazer aborto, independente do motivo, é uma criminosa. Falta então a
pergunta certa: "A mulher que fez
um aborto deve ser presa?".
Segundo, o plebiscito é tolo. Não
se trata de uma imposição à maioria, e sim a salvaguarda de um direito. Essa é uma opinião; há os que
defendem direitos de células, tudo é
argumentável. Uma legalização demandaria aconselhamento prévio
para evitar banalizações e acompanhamento posterior para orientar e
detectar eventuais reincidências.
Talvez o SUS não comporte isso, esse é outro ponto.
Mas todo o debate parece improvável, ainda mais qualificando um
plebiscito em si duvidoso, que acabaria como uma versão mais cara da
pesquisa Datafolha que indicou
contrariedade à legalização.
igielow@folhasp.com.br
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