São Paulo, Segunda-feira, 10 de Maio de 1999
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Educação ambiental no Brasil


Devemos nos educar novamente para a natureza, para nos encaixarmos em nosso "locus" ambiental


JOSÉ SARNEY FILHO

O modelo de vida por nós desenvolvido nas últimas décadas tem nos afastado, de maneira abrupta, do contato com o ambiente. A forma cada vez mais fragmentada e especializada de organizarmos a produção de bens e seu mercado (assim como nossa formação nas várias áreas do conhecimento) conduz-nos a uma visão também fragmentada dos componentes naturais da vida.
Cada vez mais, nós nos "desligamos" de nosso "locus" na engrenagem da vida na Terra. Isso nos deu a ilusão de que somos independentes dela. Passamos a tratá-la como objeto de estudo semelhante a outros tantos com que tão eficientemente lidamos -sempre, é claro, de maneira fracionada.
Hoje, somos surpreendidos pelo imenso conhecimento da natureza de algumas tribos indígenas ou comunidades tradicionais, ou mesmo quando ouvimos nossos avós falarem, com desenvoltura, sobre solos, plantas, animais, fenômenos climáticos. Talvez eles tenham vivido mais perto da natureza ou tenham tido menos "botões" entre suas necessidades e os recursos naturais capazes de satisfazê-las.
Parecem-nos tão "legítimas" quanto "distantes" as declarações do Dalai Lama que alertam para a necessidade de mudar nosso comportamento e nossos padrões de sobrevivência em relação ao ambiente e aos nossos semelhantes, para que a Terra ainda sirva de berço às próximas gerações.
Não pretendo fazer aqui apenas uma apologia da vida bucólica. Quero, ao contrário, ponderar sobre as marcas indeléveis que essa conduta coletiva tem deixado pela estrada que nós, homens ditos civilizados, temos percorrido em prol do nosso "engrandecimento" econômico, social e cultural.
Não há volta nessa trajetória do desenvolvimento humano sobre a Terra, que também tem, é bom lembrar, amealhado inegáveis conquistas para o progresso da humanidade. É indispensável, porém, uma mudança de rumos nesse caminho. E essa mudança envolve alterações nas atitudes de entes produtivos, consumidores e governamentais -enfim, de toda a sociedade- com relação ao modo de exploração dos recursos ambientais. Entre essas atitudes está, sem dúvida, a de nos educarmos novamente para a natureza, para nos encaixarmos verdadeiramente em nosso "locus" ambiental e readquirirmos a "consciência perdida" da dependência e do respeito que devemos a este planeta que nos acolhe.
Apesar de ser incrível que precisemos nos educar para algo que já nos pertenceu pela própria natureza, é urgente que o façamos, que busquemos resgatar esse conhecimento e que não mais o percamos. Assim, tenho a felicidade de informar que o Congresso deu um passo fundamental ao aprovar a lei que institui uma política de educação ambiental para o Brasil. Sancionada a lei pelo presidente da República, temos agora definidos, enfim, os princípios, as diretrizes e os instrumentos necessários à implementação efetiva de um projeto educacional abrangente de conscientização ambiental para o país.
A educação ambiental ocupa espaço privilegiado na gestão que pretendo conduzir no Ministério do Meio Ambiente. Foi criada uma diretoria, vinculada ao gabinete do ministro, para que todos os programas do ministério estejam permeados por ações de educação ambiental. A opção por esse modelo é, de certa forma, uma antecipação, na prática, do que estabelece a lei recém-aprovada, da qual tenho bastante conhecimento por ter relatado a matéria quando de sua tramitação na Câmara.
A lei prevê a educação ambiental tanto no ensino formal como de maneira não-formal. Assim, o tema deverá ser inserido em todos os níveis de ensino, da pré-escola à pós-graduação, não como disciplina, mas incluído nos conteúdos programáticos pertinentes; toda a sociedade também deve ser sensibilizada em suas atividades produtivas e formas socioculturais de organização.
Os instrumentos para isso serão: 1) a capacitação de recursos humanos, não só na área ambiental como também na iniciativa privada e no setor público, para que os profissionais sejam suficientemente informados em questões ambientais e atuem segundo a lógica da sustentabilidade; 2) estudos e pesquisas que desenvolvam metodologias em educação ambiental e avaliem os resultados obtidos; 3) difusão de conhecimentos e de tecnologias ambientalmente sustentáveis para os vários setores produtivos, para que cresçam sem consequências ambientais desastrosas; 4) apoio a iniciativas locais; 5) produção e divulgação de material educativo.
Essa lei e sua aplicação são parte fundamental do esforço empreendido pelo presidente Fernando Henrique Cardoso para dar a todos acesso à educação, de forma a aumentar as chances de inclusão de uma população ainda marginalizada do processo de desenvolvimento na economia do país. Mais: a lei é fundamental para a reeducação de todos, empresários, trabalhadores, governantes, consumidores, todos já economicamente ativos, em prol de uma nova postura diante dos recursos que temos para sobreviver e evoluir neste planeta em que nos foi dado habitar.


José Sarney Filho, 41, é ministro do Meio Ambiente e deputado federal licenciado pelo PFL do Maranhão. Foi coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista para o Desenvolvimento Sustentável.



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