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São Paulo, quarta-feira, 10 de dezembro de 2003

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FERNANDO RODRIGUES

Incompetência endêmica

TRIPOLI - Há uma certa incompetência residual endêmica no governo brasileiro que impede algumas iniciativas do presidente da República, seja ele quem for, de darem certo.
É algo que os franceses chamam de "mentalité", cujo significado é mais profundo do que o cognato em português, mentalidade. Tem a ver com a atitude abúlica, tipo jeca-tatu, que assola parte do serviço público brasileiro. Um caso emblemático é o Ministério das Relações Exteriores.
Acostumados a fazer nada ou quase nada por décadas, certos diplomatas parecem adeptos do programa "iniciativa zero" -algo que fica mais ressaltado pelo fato de o laborioso chanceler Celso Amorim se dispor a resolver desde a negociação da Alca até o conflito árabe-palestino.
Na viagem de Lula a países árabes, houve um problema grave com a tradução. O rapaz que fez o trabalho fala árabe. Trabalha no Palácio do Planalto. Encontraram-no e nomearam-no "intérprete". Foi escalado para "quebrar galho", na expressão usada dentro da delegação petista.
Num governo monoglota como o petista, caberia ao Itamaraty alertar o presidente, logo no primeiro dia da viagem, sobre o problema. Palavras eram suprimidas. Outras traduzidas de forma errada.
O que fez o Itamaraty? Seguiu a lei do menor esforço. Acreditou na informação do Planalto, qual seja a de que não existem tradutores nem intérpretes profissionais de português para o árabe no planeta Terra.
Ontem, finalmente, caiu a ficha de todos. No discurso de Lula na Liga dos Estados Árabes, "quebrou-se o galho" de maneira mais eficaz. A fala do petista foi traduzida para o inglês, e, depois, para o árabe.
Esse problema pode parecer pequeno ou insignificante. Não é. Trata-se de um sinal de como Lula soa ingênuo ao depositar tanta esperança nos diplomatas. Muitos deles precisam fazer um estágio na iniciativa privada e saber o que é o mundo real.


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