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ANTONIO DELFIM NETTO
"Spreads"
Como observou o velho doutor
Johnson, "quando dois ingleses se
reúnem, a primeira conversa é sobre o
tempo", ao que alguém depois acrescentou, maldosamente, "mas não fazem nada para modificá-lo!". Isso no
século 18. No Brasil do século 21, somos mais sofisticados: quando dois
brasileiros se reúnem, a primeira conversa é sobre o "spread" bancário e
sempre se diz que se está fazendo alguma coisa para reduzi-lo! Em 1999, o
Banco Central apresentou um volumoso e cuidadoso estudo sobre o tema e quase uma centena de sugestões.
Um bom número delas foi implementado, mas, quase quatro anos depois,
praticamente nada mudou: com bom
ou mau desempenho econômico,
com maior ou menor taxa de inflação,
o nível dos "spreads" bancários resistiu a todas as conversas. O Brasil continua a amargar uma das mais elevadas taxas de juros reais do mundo, e o
sistema financeiro instalado no país
dirige ao setor privado um volume de
crédito que não chega a um terço do
PIB, certamente um dos menores do
mundo!
Os estudos que distribuem o
"spread", contabilizado na forma de 1.
margem líquida do banco: 40,1%; 2.
impostos diretos: 20,6%; 3. cobertura
da inadimplência: 17,0%; 4. despesas
administrativas: 14,1%, e 5. impostos
indiretos: 7,9%, não podem "explicar"
porque o "spread" é tão alto, pois envolvem uma tautologia. Da mesma
forma, os estudos econométricos mais
sofisticados, que tentam negar a possibilidade de que a alta concentração
bancária, combinada com um governo profundamente endividado, reduza, de fato, a competição e dê respeitável poder econômico ao sistema financeiro, são seriamente inconclusivos. Isso tem desviado a atenção do
BC (e do governo) do problema e criado uma visível má vontade social em
relação ao sistema financeiro. É tempo, pois, de enfrentar o problema com
um pouco mais de isenção e maior
disposição de modificar a situação.
É evidente que:
1º) o "spread" incorpora os benefícios transferidos internamente ao setor privado. Perto de 40% do crédito
bancário é "direcionado" com taxas
de juros ativas inferiores às passivas.
Isso agrava as restrições produzidas
pelo gigantesco "compulsório";
2º) a concentração bancária e as altas exigências da renovação do endividamento público (e a existência de papéis cambiais) dão um poder excepcional ao setor, que pode escolher a
aplicação "sem risco", além de proteger-se da flutuação cambial, o que
"explica" boa parte de seus extraordinários ganhos;
3º) o nível de tributação das operações financeiras (direta e indireta) pode dar algum conforto ao Tesouro Nacional, mas aumenta os custos de
transação e cobra um alto preço à taxa
de crescimento real do PIB.
Isso sugere o que estamos perdendo
por não fazermos uma verdadeira "reforma tributária" que amplie a base
imponível, elimine as distorções alocativas e reduza a carga total, tornando possível atrair para a formalidade o
grande Brasil informal. A redução do
"spread" exige uma política mais ativa
do Banco Central e do governo, que
deveria: 1) estimular um sério aumento da competição no setor (reduzindo
suas despesas administrativas e as
margens); 2) providenciar a legislação
que falta para reduzir a inadimplência; 3) diminuir a tributação direta e 4)
diminuir dramaticamente o uso dos
antiquados "compulsórios", efetuando o controle monetário por outros
meios.
Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
dep.delfimnetto@camara.gov.br
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