São Paulo, Domingo, 11 de Abril de 1999
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Pizza ou pasta?

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - Desconfio que o Brasil de hoje começa a ficar parecido com a Itália de meia dúzia de anos atrás.
Explico: todo o mundo sabia que o sistema político italiano, hegemonizado pela Democracia Cristã, havia apodrecido, mas ninguém tinha a coragem de mexer no que quer que fosse por medo de que o PCI (Partido Comunista Italiano) capitalizasse, eleitoralmente, a exposição pública da disseminada podridão.
Aí, caiu o Muro de Berlim, o medo da suposta "ameaça comunista" desapareceu e a Itália pôde virar o seu sistema político de cabeça para baixo.
No Brasil, como é de praxe, a queda do Muro de Berlim só chega agora. A podridão que emerge das inúmeras investigações em curso não é nova. Mas a elite política, como a italiana, preservou-a um pouco por interesses materiais e outro tanto porque supunha-se que os "vermelhos" acabariam ganhando alguma eleição, se houvesse investigações para valer.
Agora, depois de três derrotas eleitorais consecutivas de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o símbolo mais nítido do suposto "perigo vermelho", este parece já não assustar tanto.
Por isso, passa a ser possível expor as entranhas apodrecidas de uma parte do sistema político (repare o leitor, por favor, que todos os até agora punidos e todos os até agora principais acusados pertencem ou pertenceram aos partidos nascidos do gordo ventre da Arena, o partido que respaldou o regime militar).
Nada contra a maré montante de investigações. Mas o ideal seria que se pudesse levar a comparação com a Itália às últimas consequências.
Na quinta-feira, por exemplo, o Ministério Público italiano pediu 15 anos de cadeia para Giulio Andreotti, o grande cacique da DC, sete vezes primeiro-ministro, 21 vezes ministro em diferentes gabinetes e, agora, senador vitalício.
Se e quando algum nome de calibre equivalente no Brasil enfrentar situação parecida, alguém dirá que, em vez de pizza, o país vive o "efeito pasta".


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