|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FERNANDO DE BARROS E SILVA
É o cara
SÃO PAULO - O PT deveria mandar gravar uma placa com o discurso de Delúbio Soares para colocá-lo
na entrada da sede do partido. Lula
deveria guardar uma cópia em sua
cabeceira, para ler antes de dormir,
ao lado das pastilhas contra a azia.
As palavras do ex-tesoureiro do
mensalão na última sexta são uma
peça histórica (a íntegra está em
www.folha.com.br/091289).
Ao apresentar aos dirigentes petistas as razões que o levavam a desistir da reintegração ao partido,
Delúbio inverteu o jogo, constrangendo seus desafetos: abrindo mão
de um favor (sua anistia), mostrou
aos presentes que se alguém ali devia algo não era ele, mas os muitos
que se beneficiavam do seu silêncio.
Lembrando a todos que sua vida
no PT sempre foi pautada por "fidelidade", "fraternidade", "disciplina", "companheirismo" e "profundo sentimento de solidariedade",
Delúbio disse ter "orgulho" por "ter
cumprido fiel e integralmente as
missões que o partido me delegou".
Mais adiante, volta à mesma tecla: "Não fui um alegre, um néscio,
um ingênuo. (...) Aceitei os riscos da
luta. Mas não fui senão, em todos os
instantes, sem exceção, fiel cumpridor das tarefas que me destinou o
PT". É claro o recado do filho preterido que ainda esconde muita coisa.
A adoração que Delúbio devota
ao partido faz pensar, guardadas todas as proporções, no que Hannah
Arendt chamou de "banalidade do
mal". Ele é o próprio funcionário
medíocre e arrivista, incapaz de refletir sobre seus atos sem se apegar
aos clichês da burocracia. Além disso, é sintomática sua idolatria ao PT
quando este deixou de ser um veículo de transformação da sociedade
para se converter em instrumento
de ascensão dos seus membros.
A idealização que Delúbio faz da
própria biografia, enaltecendo a figura do goiano matuto, produz menos o efeito pretendido de reparar a
sua imagem e mais o de acentuar a
devastação da imagem já carcomida
do partido que o rejeitou em nome
da moralidade, mas por mero pragmatismo. Quem aqui é mais cínico?
Texto Anterior: Editoriais: Fora do casulo
Próximo Texto: Brasília - Fernando Rodrigues: O sacrifício dos juízes Índice
|