São Paulo, sexta-feira, 11 de junho de 2010

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Editoriais

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O incerto e o duvidoso

Presença maior do Brasil no cenário global acaba sendo um dos poucos resultados visíveis no episódio das sanções contra o Irã

Aprovadas as sanções contra o Irã no Conselho de Segurança da ONU, encerra-se sem glória, mas também sem vexame, a participação brasileira nos esforços de intermediar as relações entre o regime de Mahmoud Ahmadinejad e a comunidade internacional.
Formalmente aceita por Teerã, a proposta de acordo apresentada pelo Brasil e pela Turquia, contemplando o enriquecimento de urânio fora do território persa, não foi capaz de convencer as principais potências mundiais, em especial os Estados Unidos, de que Ahmadinejad estaria disposto a desistir do projeto de contar com um arsenal atômico.
São fortes as evidências, com efeito, de que o plano turco-brasileiro não teria outro efeito a não ser o de conceder mais tempo para o regime iraniano prosseguir sem percalços na construção de uma bomba atômica.
As dúvidas acerca daquele acordo não eram muito maiores, entretanto, do que as existentes em torno das sanções agora implementadas. Trata-se da quarta, e mais enfática, tentativa internacional de intimidar as atividades estratégicas do país persa -e nada indica que venha a apaziguar a prática e a retórica de um governo dominado pelo fanatismo religioso, pelos propósitos de hegemonia regional e pela mais furiosa hostilidade contra o Ocidente.
É reduzido o histórico dos sucessos obtidos por meio de sanções internacionais. O mais eloquente, sem dúvida, foi o que se registrou no caso da África do Sul: o cerco diplomático e comercial contra aquele país teve papel importante, mas não exclusivo, no fim do "apartheid".
Ocorre que, mal ou bem, a elite racista do país africano pretendia-se integrada a padrões ocidentais de consumo e de desenvolvimento; além de enfrentar vigorosa oposição interna, não estava disposta a pagar o preço de isolar-se em definitivo.
Em Cuba e na Coreia do Norte, para citar apenas dois exemplos, ditaduras se mantêm apesar de bloqueios duríssimos, e encontram motivos de perversa legitimação nacionalista na própria resistência que opõem à mudança.
Não se sabe até que ponto as sanções das Nações Unidas irão fortalecer o movimento interno de oposição ao regime dos aiatolás; a ameaça de uma bomba iraniana, ao que tudo indica, é algo no momento tão próximo -ou tão distante- quanto no caso de se ter aceitado o acordo proposto pelo Brasil e pela Turquia.
Por isso mesmo, estes dois países não saem derrotados do episódio, nem parece plausível que venham a sofrer futuramente o peso de algum estigma antiocidental. Mostraram-se -e este o objetivo de toda a coreografia- capazes de se afirmar como vozes emergentes no cenário global. Cenário, aliás, cada vez menos propício à hegemonia de um só país, mas nem por isto receptivo às virtudes, sempre escassas, do entendimento e da negociação.


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