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CLÓVIS ROSSI
A medalha e o complexo
LISBOA - O presidente português Jorge Sampaio acabara de pendurar no
pescoço de seu colega Luiz Inácio Lula da Silva a medalha representativa
do Grande Colar da Ordem da Liberdade, criada após a chamada "Revolução dos Cravos", que, em 1974, derrubou uma ditadura de 50 anos.
Condecoração parecida (mas no
degrau abaixo, a Grã-Cruz) coube
também à mulher do presidente, Marisa Letícia.
Lula fez o agradecimento de praxe,
mas, ao final, exibindo a medalha
para a nuvem de fotógrafos que
acompanhava a cerimônia, pediu
que publicassem a foto da medalha, e
não a de "alguma gafe" que ele viesse
a cometer.
Com perdão da psicologia de botequim, o pedido passou a nítida sensação de um complexo de inferioridade
absurdamente descabido.
Lula é ele e sua história, assim resumida ontem por Jorge Sampaio, ao
lhe dar as boas-vindas a Lisboa:
"Vossa Excelência teve a dura experiência da pobreza, conheceu a prisão, provou por mais de uma vez o
sabor amargo da derrota, mas de todas as provações sempre emergiu
mais forte e determinado no seu
combate incessante por um Brasil
mais justo, mais próspero e mais solidário".
Dois terços dos brasileiros compraram essa história no segundo turno
da eleição presidencial.
Logo, não há razão para baixar a
cabeça. Lula pode comer os "esses"
no final de certas palavras, pode errar a concordância, pode até eventualmente beber a lavanda em vez de
limpar os dedos com ela.
Nada disso o impede de, eventualmente, vir a ser um bom presidente.
Como, vendo a coisa pelo avesso, a
sua história, louvada por Sampaio,
não significa que será, necessariamente, um grande presidente.
Presidentes, bons ou ruins, se fazem
no posto. Não há universidade para
formá-los.
Complexo de inferioridade só se
justificará se e quando o governo Lula trair princípios, promessas e esperanças. Essa é a única gafe que conta
e contra a qual não há remédio.
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