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Cinema sem risco
AUSENTE da agenda política,
a discussão sobre os mecanismos que regem o incentivo à cultura no Brasil merece destaque. O debate sobre as
formas de racionalizar o gasto
público não chegou a esse setor,
ainda extremamente vulnerável
à ineficiência, ao compadrio e à
promiscuidade entre interesses
públicos e privados.
Em 2005, o Ministério da Cultura registrou mais de R$ 600
milhões em recursos captados.
São freqüentes os exemplos de
mau uso desse dinheiro -de livros de arte que arrecadam milhões e não remuneram colaboradores a filmes que obtiveram
apoio mas não foram concluídos.
O ponto de maior atrito é a
produção cinematográfica. Nesse setor já existe uma indústria
em condições de buscar fontes
de financiamento privadas, dispostas a arriscar dinheiro em um
produto. Mas, como mostrou reportagem recente desta Folha, o
cinema é uma atividade produtiva em que fracasso comercial
não significa prejuízo. Protegidos pelas leis de incentivo, os filmes se pagam antes de estrear.
Não se pode negar a importância dos subsídios para viabilizar
iniciativas com finalidades restritas a um nicho regional ou a
uma fatia pequena e específica
de público. A mesma regra, porém, não pode valer para grandes produções. Não é raro um filme nacional ultrapassar a marca
de 1 milhão de espectadores.
Nos últimos dez anos, mais de
US$ 500 milhões fluíram dos cofres públicos para a atividade cinematográfica a título de renúncia fiscal. Não é razoável que essa
transferência se dê num modelo
que anula o risco e a necessidade
de apresentar resultados.
É frágil o argumento oficial,
segundo o qual a política de subsídios permite ao Brasil superar
a condição de simples consumidor de cinematografias estrangeiras. No início esse método de
incentivo pode ter sido relevante
para a reestruturação da atividade local, mas hoje degenerou em
acomodação à custa do erário.
Cabe apenas ao artista decidir
que critérios usará na confecção
de um filme. Mas o risco de seu
produto transformar-se num
fracasso comercial é um ônus
que deveria também caber a ele,
e não apenas ao contribuinte.
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