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MARCOS NOBRE
O cidadão e
o magistrado
É NO MÍNIMO intrigante encontrar declarações do presidente do STF todos os dias
nos meios de comunicação. Ele se
pronuncia sobre os temas mais variados da pauta da discussão pública, desde a edição de medidas provisórias até o uso de algemas.
Segundo a Lei Orgânica da Magistratura, em seu artigo 36, inciso
III, é vedado ao magistrado "manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo
pendente de julgamento, seu ou de
outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças,
de órgãos judiciais, ressalvada a
crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistrado".
Ao expor seus argumentos na esfera pública, o magistrado deixa o
campo do direito e passa ao campo
da disputa política. Como cidadão,
deve ter o direito, sob determinadas condições, de expressar suas
opiniões. As declarações de Gilmar
Mendes não devem ser interpretadas como elaborações técnicas no
campo do direito, mas como legítimos posicionamentos políticos.
Interpretados assim, tem-se a
impressão de que seus pronunciamentos são críticas a órgãos ou políticas de governo. Ou condenações
de movimentos como a greve de
policiais civis em São Paulo. Às vezes parecem confrontos com declarações de integrantes do governo Lula, como foi o caso de seu pronunciamento sobre o "terrorismo"
durante a ditadura militar.
O que intriga é justamente por
que suas declarações dão essa impressão neste momento. E a resposta talvez esteja no fato de que a
oposição se encontra amarrada em
pelo menos dois sentidos.
Com crise econômica e tudo, a
popularidade de Lula continua nas
alturas. Qualquer postulante à candidatura presidencial pela oposição pode perder posições preciosas
se criticar o governo Lula neste
momento.
Além disso, os dois principais
nomes da oposição são governadores de Estado. Tanto José Serra
(mais que provável candidato oficial do PSDB) como Aécio Neves
dependem do repasse regular de
verbas federais para fazerem deslanchar a série de obras dos dois últimos anos de governo. Só para
2009, o investimento de Minas e
de São Paulo estimado pela Folha
é de R$ 30 bilhões.
Se a crise pegar forte por aqui, se
a popularidade de Lula sofrer com
isso, é possível que os líderes da
oposição venham a assumir mais
cedo o seu papel de críticos diuturnos do governo. Do contrário, só
irão assumir essa posição no ano
eleitoral de 2010, quando o ministro Gilmar Mendes deixará a presidência do STF. De um jeito ou de
outro, o timing não poderia ser
mais perfeito para a oposição.
nobre.a2@uol.com.br
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta
coluna.
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