São Paulo, terça-feira, 12 de fevereiro de 2002

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PESO FLUIDO

Como era de esperar, foi confuso o primeiro dia de livre flutuação da moeda argentina. O dólar norte-americano fechou o dia cotado a 2,10 pesos, em meio a um clima generalizado de incerteza na população daquele país. Outro termômetro da primeira jornada do novo regime foi o comportamento da Bolsa de Valores portenha, que caiu 10,7%.
No mesmo dia em que o peso livre debutava, o ministro da Economia, Remes Lenicov, partia para uma dura negociação em Washington. Tenta convencer o reticente governo George W. Bush a avalizar uma ajuda financeira do FMI à Argentina.
As dificuldades para que o novo sistema monetário se enraíze são de monta. Por mais de dez anos, a população se desacostumou a trabalhar com um sistema de moeda fiduciária -sem lastro, baseada apenas na confiança. As autoridades e a tecnocracia também terão de mudar radicalmente a sua forma de agir. Têm de readquirir padrões de intervenção na economia, de monitoramento das variáveis-chave, de controle das informações. É, grosso modo, como se um banco central como o brasileiro tivesse de nascer e operar a todo o vapor num curto espaço de tempo.
Quando se implanta um regime monetário de tipo fiduciário, tudo gira em torno da confiança depositada pelos usuários da moeda nos gestores da política. E confiança é matéria escassa na Argentina. Do ponto de vista técnico, se poderia dizer que o sistema de câmbio flutuante tende a funcionar bem quando há oscilações tanto para cima como para baixo. Em outras palavras, comprar dólares tem de tornar-se operação de risco.
Há alguns fatores que parecem conduzir os argentinos às casas de câmbio, entre eles falta de confiança na política, um trauma coletivo da hiperinflação e grande liberdade para os cidadãos comprarem moeda estrangeira. Tudo isso é compreensível. Mas a demora do FMI e do governo dos EUA em bater o martelo sobre o auxílio à Argentina começa a fornecer sentido a algumas teses conspiratórias. Se o Plano Duhalde soçobrar, é bastante provável que a dolarização entre na pauta da política argentina com uma força inédita.


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