São Paulo, Sexta-feira, 12 de Fevereiro de 1999
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AMEAÇA INTOLERÁVEL

O anúncio do governador mineiro, Itamar Franco, de que está convocando a cúpula da Polícia Militar para uma reunião, tendo um assessor seu liberado os jornalistas para interpretar como quiserem a notícia, seria apenas uma "grotesquerie", não pudesse ter desdobramentos imprevisíveis -mas, certamente, nefastos.
O ex-presidente já se mostrara irresponsável ao declarar a moratória das dívidas de seu Estado, mal se sentou à cadeira de governador, ridicularizando, a seguir, o efeito que seu gesto teve sobre a credibilidade externa do país.
É evidente que não foi a moratória de Minas que implodiu o real. Mas o gesto intempestivo não apenas precipitou a crise cambial como serviu para dramatizar as dificuldades que o Estado brasileiro enfrenta, em todos os seus níveis, para colocar as contas em ordem.
O ressentimento de Itamar Franco com o presidente Fernando Henrique Cardoso e a propalada ambição de vir a sucedê-lo em 2002 são as explicações mais plausíveis para esses gestos extremados.
Agora, no entanto, o fato de insinuar o envolvimento da Polícia Militar numa questão que é estritamente financeira soa como um desafio à própria estrutura democrática do país como um todo. Não há indícios de que a ordem pública esteja sob ameaça em Minas, nem muito menos de que a ordem constitucional corra riscos no país. Qual o sentido, então, dessa mais recente bravata se não instalar uma escalada de terrorismo verbal?
É grotesco, mas nem por isso deixa de ser inquietante. Funcionará aos olhos de observadores externos como um sinal, aliás falso, de que estaria em risco a governabilidade.
Em lugar de dirimir suas pendências com o governo federal por meio do diálogo, o governador de Minas apela para recursos de ameaça que são intoleráveis numa democracia. Ainda é tempo de o governador cair em si, pensando mais no Brasil e menos em seus problemas pessoais.


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