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CARLOS HEITOR CONY
"E la nave va"
RIO DE JANEIRO - Nada surpreendente na decisão do Brasil de negar
o pedido da Itália sobre o caso Battisti. Para simplificar, diria que a
respeito de extradições temos uma
tradição nacional e cito dois exemplos mais ou menos recentes. O do
inglês Ronald Biggs e o do austríaco
Gustav Franz Wagner.
O primeiro havia tomado parte
no assalto a um trem pagador, conseguiu escapar, rodou meio mundo
e veio parar no Brasil. Policiais ingleses tentaram prendê-lo aqui
mesmo, houve bate-boca diplomático; enquanto isso, o ladrão casou
com uma brasileira e teve um filho,
deixaram o cara em paz, chegou a
ser guia turístico, até que adoeceu e
quis voltar para a Inglaterra, onde
ficou preso num hospital e morreu.
O caso do outro rendeu um filme
nos Estados Unidos. Era guarda no
campo de concentração de Sobibor, na Polônia. Um gigante, de
mãos imensas e olhos frios. Recebia
as levas dos judeus prisioneiros na
estação de trem, arrancava as
crianças do colo das mães e as espatifava num poste. Viveu anos em
Atibaia (SP) até que foi preso pelo
então delegado Romeu Tuma. Três
países pediram sua extradição, Polônia, Alemanha e Israel. Morreu
meio louco, em liberdade.
No caso de Battisti, a Itália pretende engrossar, mas o premiê Berlusconi já avisou que não vai declarar guerra ao Brasil por causa dele.
Ainda bem. Com exceção das Guerras Púnicas, tudo o que aconteceu e
acontece na Itália é culpa do primeiro-ministro. Há muito Catão por
lá, repetindo o "delenda Carthago"
em relação ao Brasil. Não temos nada a temer, a Itália tem problemas
de sobra, inclusive com o próprio
Berlusconi, que um dia desses pode
pedir asilo no Brasil, repetindo um
antecessor (Bettino Craxi) que morreu no exílio. E é assim que, segundo Fellini, "la nave va".
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