São Paulo, domingo, 12 de setembro de 2004

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SEM PRECIPITAÇÃO

A recuperação da atividade econômica prossegue no Brasil e já há algum tempo não se pode atribuir exclusivamente às exportações o dinamismo da produção. O mercado interno, que tanto se contraiu no ano passado, também passa por uma reativação. Em paralelo, os índices de inflação revelam um quadro de relativa pressão, em especial sobre os preços da indústria no atacado. Mas os aumentos já chegam ao consumidor: em agosto, o IPCA, índice oficial que baliza as metas de inflação, teve alta novamente um pouco maior do que antecipavam os analistas. Assim, as taxas de inflação projetadas por bancos e consultorias para este ano e o próximo estão se movendo lentamente para cima, de acordo com a compilação do Banco Central.
Embora essas projeções ainda indiquem ser provável o cumprimento das metas para a inflação dentro das margens de tolerância, o BC já deixou claro que poderá atuar para impedir que as expectativas acerca da inflação continuem a se deteriorar.
Está formado, assim, um quadro propício para que aumentos da taxa de juros sejam defendidos por alguns analistas. Até mesmo membros da cúpula do governo, como os ministros da Casa Civil e do Planejamento, já declararam que admitem a hipótese de elevação de juros, avaliando como pouco significativo os impactos da medida sobre o desempenho da atividade produtiva.
À primeira vista, o quadro poderia justificar um aumento da taxa básica: pretensamente, a economia estaria excessivamente aquecida, e a inflação, escapando ao controle. Há, porém, perigos nessa avaliação.
É preciso levar em conta vários elementos, a começar do nível atual da taxa de juros básica, excessivamente alto. Um dos elementos que contribuem para tanto é o fato de ter sido estabelecida uma meta por demais ambiciosa de redução da inflação em 2004. A inflação de 2003 foi de 9,3%. Levando em conta que tarifas como as de energia elétrica e de telefonia, responsáveis por quase 30% do índice oficial, têm reajustes indexados ao comportamento da inflação do ano anterior, reduzir o aumento de preços a 5,5% em 2004 demandaria conter de modo abrupto o ritmo de alta dos preços dos demais itens. Isso seria difícil em qualquer circunstância, mais ainda quando se sabe que ocorreu um choque de custos derivado das cotações das commodities, como metais e petróleo.
Outro elemento a considerar é a necessidade de preservar a incipiente recuperação do investimento. Como ele se tem mantido baixo há duas décadas, uma retomada mais firme tornou-se vital para evitar o agravamento de gargalos de oferta.
As iniciativas, portanto, com impacto adverso sobre a recuperação do investimento são indesejáveis. Por mais torneios retóricos que se façam, um aumento de juros é reconhecidamente um fator adverso. Melhor seria evitá-lo, até porque é cedo para afirmar que há grande risco de efetivo descumprimento das meta de inflação considerando-se as margens de tolerância.


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