São Paulo, domingo, 12 de novembro de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Antídotos contra a subserviência

PAULO SKAF

É inconcebível que, 179 anos depois, ainda não tenhamos vencido desafios que constavam de decreto assinado por d. Pedro 1º

CONDIÇÃO básica para o desenvolvimento é a oferta de ensino de qualidade a todas as crianças e jovens. Esse é o diferencial competitivo mais importante nesta era em que informação, ciência e tecnologia são sinônimos de soberania e antídotos contra a subserviência. Neste cenário, os professores são protagonistas da redenção das nações emergentes e subdesenvolvidas. As engrenagens do planeta se movem a partir das salas de aula.
Assim, é preocupante o alerta do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), da OIT (Organização Internacional do Trabalho) e do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância): "O número de professores terá de aumentar em 18 milhões na próxima década se o mundo quiser universalizar o ensino básico".
Segundo o comunicado, um empecilho à expansão do acesso à educação é a falta de professores. Além disso, são numerosos os que trabalham em condições críticas.
"É um problema grave, pois os docentes são o coração do sistema educacional", salientam os especialistas Kemal Dervis, do Pnud, Koïchiro Matsuura, da Unesco, Juan Somavia, da OIT, e Ann Veneman, do Unicef, acrescentando: "Não há solução viável para os desafios educacionais e a falta de professores sem investimento em treinamento e medidas para promover o respeito à profissão".
Em nosso país, no qual o analfabetismo pleno ainda está próximo de 11%, e o funcional, em torno de 30%, num desconfortável somatório de 40% da população maior de 15 anos, o comunicado das agências da ONU (Organização das Nações Unidas) soa como um tapa na cara.
Por isso, em vez de lamentar os erros do passado e do presente, é necessário, com humildade, responsabilidade e bom senso, analisar o que pode e deve ser feito para consolidar e ampliar os avanços do ensino no Brasil. Boa parte das soluções se encontra no próprio relatório conjunto dos organismos multilaterais: contratação de mais docentes e melhoria das suas condições de trabalho e de sua remuneração. Também é necessário que tenham mais voz ativa na reforma educacional. Devemos estar atentos às recomendações, embora a situação no Brasil, pelo menos no tocante às vagas nas escolas, esteja melhor do que na média das nações subdesenvolvidas e emergentes.
Tais reflexões são de extrema importância neste momento em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva acaba de ser reeleito e, em suas primeiras declarações à imprensa, demonstra preocupação e interesse quanto ao ensino.
Mais do que um discurso político, seu compromisso deve despertar a consciência quanto ao fato de que a responsabilidade pela universalização da escola de qualidade precisa ser compartilhada pelo Estado e pela sociedade, embora recaia sobre o governo a atribuição constitucional de prover educação. Boa notícia é constatar os exemplos bem-sucedidos fora do setor público, como se observa no Sesi e no Senai (Serviço Social da Indústria e Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, respectivamente).
Em nosso Estado, integrados ao sistema Fiesp, o Sesi-SP, maior instituição de ensino privado do país, tem 211 escolas, 5.108 professores e quase 200 mil alunos, e o Senai-SP, 83 centros de formação profissional, 68 unidades móveis, 1.941 docentes e 825 mil matrículas. Exatamente como recomendam as agências da ONU, novas medidas estão sendo adotadas para promover o aperfeiçoamento e maior integração das duas redes.
No Sesi-SP, além da educação infantil e do ensino fundamental, haverá, a partir de 2007, o ensino médio e, em algumas escolas, o regime de período integral. Além disso, os alunos da segunda série do ensino médio poderão ingressar nos cursos técnicos do Senai-SP sem exame de seleção.
Dessa maneira, concluirão simultaneamente os dois cursos, tendo uma profissão antes mesmo do ingresso na universidade. São avanços cuja relação custo/benefício é excelente para alunos, famílias e comunidade.
Contraponto: em 15 de outubro de 1827, o imperador d. Pedro 1º assinou decreto criando o Sistema de Ensino Elementar do Brasil. O documento já fazia referência a medidas como a descentralização escolar, remuneração dos docentes e sua admissão nas escolas, combate ao analfabetismo e inclusão das meninas no sistema educacional. É inconcebível que, 179 anos depois, ainda não tenhamos vencido tais desafios.


PAULO SKAF, 51, empresário, é presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

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