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RUY CASTRO
Escrevendo com chumbo
RIO DE JANEIRO - Na quarta-feira passada, em Omaha, Nebraska, EUA, o garoto Robert Hawkins,
18, com problemas na família, na
escola e na polícia, foi despedido do
McDonald's onde trabalhava, acusado de furtar US$ 17, e ainda levou
um chute da namorada. Em meio a
seu inferno íntimo, escreveu um bilhete: "Sei que sou um merda. Mas,
agora, vou ficar famoso". Pegou seu
fuzil, entrou num shopping, matou
oito pessoas e se matou.
Robert ficou famoso -por três
dias. No sábado e no domingo seguintes, não um, mas dois atiradores isolados, ambos no Estado do
Colorado, também abriram fogo
contra inocentes, abatendo um total de quatro pessoas e ferindo outras tantas. Roubaram o seu show.
Pode-se dizer que o garoto de Nebraska, sozinho, matou o dobro que
os dois juntos e, por isso, deveria ficar por mais tempo no noticiário.
Que nada. A essa altura, já quase
ninguém se lembra de seu nome.
Até o fim do ano, terá sido reduzido
a um número e seu atentado não
passará de uma estatística na violência americana. Os dois atiradores que o sucederam terão o mesmo destino. Só as vítimas continuarão a ser lembradas, e com que dor.
Quero crer que a motivação principal de Robert não era a de "ficar
famoso" -e, se foi, ele seria só mais
uma vítima dessa cretina cultura de
celebridade que nos assola. Prefiro
achar que, como a maioria dos jovens que disparam contra grupos e
depois se matam, ele queria apenas
se expressar.
Fosse no século 19, um menino
como Robert se alistaria na Legião
Estrangeira ou escreveria poesia e
morreria tuberculoso. Em meados
do século 20, ele iria para a luta armada ou se tornaria um crítico estruturalista. Em nossos dias, Robert tira seu próprio fuzil do armário e grava seu testemunho com
chumbo no corpo de quem não tem
nada com isso.
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