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O acordo de redução do IPI dos carros contribui para evitar demissões?
NÃO
Preservar quais empregos?
ENILSON SIMÕES DE MOURA
A imprensa tem noticiado, mesmo
sem grande destaque, dados que reforçam minha posição contrária à redução
de impostos para a indústria automobilística. A própria Receita Federal calcula em R$ 792 milhões a perda anual
que a União terá por conta da redução
do IPI. Esse dinheiro seria suficiente
para que mais de 500 mil desempregados recebessem um salário mínimo durante 12 meses. Número que, segundo
dados da pesquisa Seade/Dieese, corresponde a um terço de todos os desempregados da área metropolitana de
São Paulo.
Esses cálculos não incluem o que será
perdido com a redução de ICMS, imposto estadual. Alega-se que a redução
de impostos será compensada pelo aumento nas vendas, o que, por consequência, manterá os empregos dos trabalhadores. Puro engano.
Para começar, o acordo com as montadoras, que reduz o IPI, prevê garantia
de emprego por apenas 90 dias. A redução de IPI já foi posta em prática no
ano passado, numa época em que a
economia não atravessava a crise que
ora enfrentamos. O desemprego cresceu, e a arrecadação caiu 47%...
O fato principal é escamoteado. Hoje,
produzem-se muito mais carros com o
mesmo número de operários. A modernização das linhas de produção decretou o fim de inúmeras profissões na
indústria, principalmente no setor automotivo. Em 1959, a proporção de veículos fabricados por trabalhador era de
3,2. Ela foi aumentando: em 1974, saltou para 8,7; em 1997, chegou a 19,5.
Isso mesmo: quase 20 carros fabricados
por trabalhador! E a indústria, mascarando um dado que é evidente, condiciona a manutenção de empregos à redução de impostos. Que empregos?
Vários setores da economia sofrem
com impostos absurdos. Nem por isso
contam com a mesma benevolência das
autoridades. Pelo que sei, o povo ainda
não come carros. Essa falta de hierarquia nas prioridades oficiais contrasta
com a sanha do governo em partir para
cima de setores com menor poder de
mobilização e, portanto, com menor
visibilidade na mídia. Refiro-me aos
aposentados, às mulheres trabalhadoras gestantes e ao funcionalismo público (que não vê a cor de reajustes salariais há cinco anos).
Fatos como a redução de impostos
para montadoras, sob a esfarrapada
desculpa de que é preciso garantir o
emprego de metalúrgicos, revelam a
absoluta (e absurda) falta de política
para o trabalho e o emprego no Brasil.
Trabalho, no mundo de hoje, não conhece geografia. As relações trabalhistas, antes perenes e objetivas, hoje se
mostram em constante processo de
mutação, rápidas e dinâmicas. Já vai
longe o tempo em que um trabalhador
iniciava e concluía sua carreira sob o
teto de uma mesma empresa, assim como já ficou na história a relação quase
automática entre diploma e emprego.
Hoje, a constante necessidade de especialização, ao mesmo tempo em que
exige do trabalhador um conhecimento
cada vez mais generalista, impõe mecanismos novos e revolucionários às relações trabalhistas.
Vivemos hoje a terceira Revolução
Industrial. A remodelação tecnológica
e administrativa das empresas exige
um novo perfil de trabalhador e põe a
descoberto as falhas graves de um país
que veio, ao longo das últimas décadas,
descuidando da educação básica de
suas crianças e seus cidadãos. As exigências para o trabalho mudaram rapidamente, mas o trabalhador ainda é o
mesmo de décadas atrás...
A Social Democracia Sindical postula
uma política de trabalho voltada para o
cidadão. Uma política que o transforme num verdadeiro empreendedor, em
vez de um empregado descartável.
Enilson Simões de Moura (Alemão), 38, metalúrgico, é
presidente da central SDS (Social Democracia Sindical).
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