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CARLOS HEITOR CONY
O pão e o diabo
RIO DE JANEIRO - Ainda bem. Temos um presidente que, além de metalúrgico, é metafísico. Sempre que
está apertado, apela para Deus e, na
semana passada, apelou para o Diabo, admitindo que o povo brasileiro,
em 2003, comeu o pão que o diabo
amassou.
Não temos nada contra as crenças
presidenciais, que são as minhas, por
sinal, embora acredite mais no Diabo
do que em Deus. Mas não deixa de
ser cômodo para qualquer um esperar a ajuda de Deus para os problemas pessoais e atribuir ao Diabo as
coisas que não estão dando certo
Desde que Lúcifer foi precipitado
nas profundas do inferno, e o mundo
ainda nem fora criado, tudo de ruim
que acontece é creditado à sua peçonha, desde a tentação de Adão e Eva
no paraíso terrestre até o 1% do Waldomiro no Palácio do Planalto.
Nessa briga de Deus com o Diabo,
que atravessa milênios, onde ficamos
nós, os homens de boa ou de má vontade? Que Lula tem boa vontade é
evidente. Má vontade têm os que lamentam ou criticam as inúmeras coisas que não funcionaram, como o Fome Zero e a prometida criação de
não sei quantos milhões de empregos.
Estamos em abril, mês que T.S. Eliot
considerou cruel -e cito o poeta pela
segunda vez no espaço de uma semana. Abril representa um terço do ano.
Até agora, o governo liberou menos
de 3% dos créditos orçamentários para fazer o país rolar vegetativamente,
uma vez que não há nenhum plano
de metas colossais como as dos tempos de JK. O espetáculo que Lula vem
prometendo se resume ao trivial variado, ao forno e fogão de uma cozinha administrativa.
Em compensação, além de Deus e
do Diabo, que brigam há séculos pela
posse da alma humana, há o FMI,
que nada tem de metafísico. Discute-se de que lado ele está, mas sabemos
que o FMI nunca ficou tão satisfeito
com o Brasil. Afinal, quem está
amassando o pão nosso de cada dia?
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