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São Paulo, segunda-feira, 13 de outubro de 2003

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CARLOS HEITOR CONY

Custo intolerável

RIO DE JANEIRO - Não tenho procuração de Jorge Semprún para responder à carta aberta que lhe endereçou Frei Beto, na página 3 deste jornal, na semana passada. Estivemos em Cuba como jurados da Casa de las Americas, em 1968, conheço sua posição e seu passado. Ele foi guru de seus amigos, como Simone Signoret, Yves Montand e Alain Resnais, que filmou um de seus roteiros mais conhecidos, "A Guerra Acabou", episódio autobiográfico do próprio Semprún.
Sempre foi um dissidente dos partidos comunistas, tendo sido expulso de dois deles, o espanhol e o francês. Esteve preso num campo de concentração de Brunschald por suas atividades políticas e desagradou ao comunismo internacional ao fazer o roteiro de "A Confissão" (1972), de Costa-Gravas, sobre uma das vítimas da tortura a que stalinistas tchecos submetiam os seus dissidentes.
Desde aquele remoto ano, Semprún faz restrições ao regime castrista, as mesmas que eu faço. Sabemos que o bloqueio imposto pelos Estados Unidos àquela heróica ilha explica muitos dos atos de Fidel, mas não justifica a falta de liberdade individual, a liberdade de pensar, que, ali, continua sendo punida com a prisão, a tortura e a morte.
O divisor de águas de Semprún, em relação a Fidel, é ainda de 1968, quando o comandante cubano foi o primeiro chefe de Estado que apareceu em Moscou para dar solidariedade à invasão da Tcheco-Eslováquia pelas tropas do Pacto de Varsóvia, naquela que foi chamada a Primavera de Praga.
A posição de Semprún é clara: não adianta mudar o mundo e o homem por meio de uma revolução para continuarmos sendo lobo dos homens, repetindo os mesmos processos e a mesma violência da situação que pretendemos mudar. Simples, até certo ponto evangélico.
É uma pena que as conquistas da revolução cubana -o sucesso na educação e na saúde- continuem tendo um custo que o homem livre não deve pagar.



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