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CARLOS HEITOR CONY
Custo intolerável
RIO DE JANEIRO - Não tenho procuração de Jorge Semprún para responder à carta aberta que lhe endereçou
Frei Beto, na página 3 deste jornal,
na semana passada. Estivemos em
Cuba como jurados da Casa de las
Americas, em 1968, conheço sua posição e seu passado. Ele foi guru de seus
amigos, como Simone Signoret, Yves
Montand e Alain Resnais, que filmou
um de seus roteiros mais conhecidos,
"A Guerra Acabou", episódio autobiográfico do próprio Semprún.
Sempre foi um dissidente dos partidos comunistas, tendo sido expulso
de dois deles, o espanhol e o francês.
Esteve preso num campo de concentração de Brunschald por suas atividades políticas e desagradou ao comunismo internacional ao fazer o roteiro de "A Confissão" (1972), de Costa-Gravas, sobre uma das vítimas da
tortura a que stalinistas tchecos submetiam os seus dissidentes.
Desde aquele remoto ano, Semprún
faz restrições ao regime castrista, as
mesmas que eu faço. Sabemos que o
bloqueio imposto pelos Estados Unidos àquela heróica ilha explica muitos dos atos de Fidel, mas não justifica a falta de liberdade individual, a
liberdade de pensar, que, ali, continua sendo punida com a prisão, a
tortura e a morte.
O divisor de águas de Semprún, em
relação a Fidel, é ainda de 1968,
quando o comandante cubano foi o
primeiro chefe de Estado que apareceu em Moscou para dar solidariedade à invasão da Tcheco-Eslováquia
pelas tropas do Pacto de Varsóvia,
naquela que foi chamada a Primavera de Praga.
A posição de Semprún é clara: não
adianta mudar o mundo e o homem
por meio de uma revolução para continuarmos sendo lobo dos homens,
repetindo os mesmos processos e a
mesma violência da situação que
pretendemos mudar. Simples, até
certo ponto evangélico.
É uma pena que as conquistas da
revolução cubana -o sucesso na
educação e na saúde- continuem
tendo um custo que o homem livre
não deve pagar.
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