São Paulo, terça-feira, 14 de março de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O modelo econômico de pobreza

CHARLES A. TANG

O aumento pífio do nosso PIB em 2005 e o espanto causado pela sua queda no final do ano foi uma surpresa para muitos, mas não se podia esperar outra coisa. Afinal, esse índice econômico é o resultado que deveria ser esperado da política econômica aplicada. A taxa de juros exorbitante -a mais alta do mundo-, a variedade exótica de 61 tributos asfixiantes e a taxa de câmbio artificial só podem ter sido aplicadas com o claro intuito de frear a demanda agregada e o nosso crescimento econômico. Nesse sentido, foi um sucesso total!


É disto que o Brasil está necessitando: um plano de prosperidade para a nação, inclusive para reerguer a auto-estima


A adoção dessas medidas recessivas não chega a surpreender. É o prosseguimento da prática em vigor nas últimas décadas, que sempre resultou em ciclos viciosos de períodos de crescimento econômico abatidos por períodos de recessão autogeradas. Achávamos que tais práticas criariam condições para o crescimento sustentado, sempre a ter início no ano seguinte. Impondo-se como verdade absoluta que estabilidade monetária só é possível com estagnação econômica e pobreza, sempre se recorreu à taxa de juros para impedir um crescimento econômico digno de nota.
Essa falha de concepção e de percepção, ao levar à aplicação somente da brilhante teoria monetarista, resultou até na inversão da ordem natural das prioridades. Qualquer teoria econômica tem por objetivo final o bem-estar econômico e a prosperidade social. Todavia, sempre se conseguiu entravar o nosso crescimento econômico a fim de não embaraçar as políticas monetárias recessivas que nos têm sido impostas.
Foi assim que, só nos últimos 12 anos, conseguimos desperdiçar um PIB inteiro de recursos tomados de empréstimo, os quais não nos propiciaram nenhum retorno -além de estagnação e pobreza-, a fim de manter a infausta ilusão de estabilidade monetária e de que estaríamos criando as bases para um futuro de crescimento sustentado.
Só em 2005, essa ilusão nos custou nada menos que R$ 157 bilhões em juros exorbitantes. O valor pago para sustentar tal ilusão ao longo das décadas perdidas poderia ter sido investido em obras que enriquecessem nossa rede de infra-estrutura e nossa estrutura de saúde e de educação e poderia ter aliviado a miséria que ainda grassa em nosso país.
Não conseguimos enxergar como alguns países emergentes, especialmente da Ásia, deixando de lado o Consenso de Washington, conseguiram registrar notável crescimento econômico com estabilidade monetária aliado a taxas civilizadas de juros e a um nível aceitável de tributação.
Enquanto isso, aqui se continuou, com muita teimosia, a insistir nesse modelo de pobreza, o qual vem provando há décadas que não corresponde ao nosso desejo por dias melhores e prosperidade comum. Em sentido contrário ao nosso, esses países emergentes conseguiram estabilidade monetária pelo caminho do crescimento econômico e da geração de riqueza. Além de incentivar a entrada de receita via exportação, eles conseguiram um equilíbrio entre oferta e demanda em patamares superiores. Escolheram o modelo econômico de riqueza.
A concepção do modelo mercantilista da China não tem muito de inovador e complexo. Desde os primórdios da história econômica da humanidade, uma nação sempre prosperou vendendo para outras nações. Até pouco tempo atrás, a China era uma nação pobre, e seu povo tinha a mente contaminada por três décadas de um socialismo mais preocupado com a pureza ideológica do que com promover o crescimento econômico e bem-estar social de seu povo.
Para agravar ainda mais, a China se viu mergulhada em uma "Revolução Cultural" que promoveu, por dez anos, uma sufocante histeria de massa. Mas foi a partir dessas dificuldades que a China conseguiu, em muito pouco tempo, tirar perto de 400 milhões de chineses da faixa da pobreza, incluindo-os na vida econômica, com o que passaram a participar ativamente de seus sucessos.
Após a morte de Mao Zedong, a nova liderança chinesa, encabeçada por Deng Xiaoping, conseguiu, com muita dificuldade e sacrifícios -até pessoais-, reestruturar o país e ampliar a visão do povo chinês. Considerando as barreiras criadas pela mente condicionada do povo chinês aliada aos interesses enraizados tendentes a manter o "status quo", uma reestruturação do Brasil e a mudança de visão do nosso povo, que sempre apoiou os planos econômicos criados, seria uma tarefa muito mais fácil.
Esses anos todos em que se persistiu em preparar as bases para um hipotético crescimento sustentado, com estagnação e pobreza, foram exatamente o tempo em que os chineses se empenharam em transformar aquela nação em uma fabulosa máquina de exportação, com níveis crescentes de receitas em divisas.
É disto que o Brasil está necessitando: um plano de prosperidade para a nação, inclusive para reerguer a auto-estima nacional, tão debilitada ultimamente; um modelo econômico de riqueza, a fim de incluir o Brasil no Primeiro Mundo.

Charles Andrew Tang, membro do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, é presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China.


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