São Paulo, sexta-feira, 14 de março de 2008

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Por trás do PIB

Os resultados de 2007 reforçam os indícios de que a economia vem se habilitando a crescer sem pressionar a inflação

OS NÚMEROS do PIB do ano passado, divulgados anteontem pelo IBGE, foram positivos. Embora tenha havido uma nota dissonante -a apuração, conflitante com outros indicadores, de que o consumo se acelerou abruptamente no fim de 2007-, no geral os resultados reforçaram os indícios de que a economia brasileira vem se habilitando a crescer com maior velocidade sem pressionar a inflação.
A incapacidade de sustentar um ritmo razoável de expansão foi uma característica marcante da economia por mais de duas décadas. A vulnerabilidade das contas externas conduzia recorrentemente a bruscas interrupções dos surtos de crescimento.
Essa instabilidade realimentava um círculo vicioso. As empresas relutavam em investir, com receio, seja de que o crescimento da demanda logo cessasse, seja de que o câmbio sofresse uma guinada. E o baixo nível do investimento prejudicava a sustentação do crescimento da economia: nos períodos de retomada da atividade logo surgiam gargalos de oferta a pressionar a inflação e as contas externas.
Vê-se agora, com clareza, como o quadro mudou, graças sobretudo ao fortalecimento das contas externas. O risco de interrupção do crescimento diminuiu muito, dissipando o círculo vicioso que travava o investimento. Por isso ele pôde crescer 13,4% em 2007, chegando a superar 40% de alta a partir de 2004 -mais que o dobro do aumento do PIB no período (19%).
A bonança internacional iniciada em 2003, que ora ameaça encerrar-se, contribuiu muito para essa melhora. Permitiu, em especial, o acúmulo de um grande "colchão de reservas" de dólares. Esse "colchão" há meses vem amortecendo os efeitos, sobre a economia doméstica, da turbulência financeira global.
Mas há que administrar com cautela os efeitos da bonança -que podem estender-se por algum tempo. Veja-se o que vem ocorrendo com a cotação doméstica do dólar. A taxa de juros nos EUA sofreu sucessivos cortes e deverá continuar em queda. Em concomitância, a taxa de juros brasileira manteve-se estável, o que resultou num aumento da atratividade das operações financeiras voltadas a usufruir do diferencial (elevado e crescente) entre os juros internos e externos. Com isso as pressões de valorização do real voltaram a aumentar.
O governo reconhece os riscos que uma valorização pronunciada e prolongada do real pode suscitar. Por isso anunciou medidas voltadas a, simultaneamente, reduzir custos financeiros incorridos pelos exportadores e amenizar a "sobra" de dólares que pressiona a sua cotação para baixo. Trata-se da permissão para que até 100% da receita das vendas externas seja mantida no exterior (o que reduz custos financeiros incorridos pelos exportadores) e de um aumento da tributação sobre alguns tipos de entrada de capitais externos.
Há razões para duvidar da eficácia de tais medidas, enquanto a taxa de juros básica brasileira permanecer muito acima do padrão internacional.


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