São Paulo, domingo, 14 de julho de 2002

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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES

Dá para entender?

Os cenários internacional e nacional vêm sofrendo do mesmo mal -uma perigosa falta de credibilidade.
Nos Estados Unidos, onde a economia é ancorada nas Bolsas de Valores, o mercado financeiro está estarrecido com as consequências das mentiras plantadas em certos balanços. Só em 2002 os investidores (empresas e povo) perderam US$ 2,4 trilhões, que representam 25% do PIB americano!
Trata-se de um empobrecimento colossal e gerador de incalculáveis problemas futuros. De um dia para o outro, as ações viraram pó, prenunciando o clima de 1929 quando tudo era rosa para o presidente Herbert Hoover e negro para o mercado.
O presidente George W. Bush compareceu ao paraíso da livre iniciativa -a Bolsa de Wall Street- para dizer que o governo vai intervir na economia, exigindo dos agentes econômicos seriedade e ética.
Tal atitude, além de inusitada para um republicano, pouco efeito teve -as Bolsas de Valores caíram no dia do pronunciamento-, mesmo porque duas graves suspeitas recaem sobre ele e seu vice-presidente, Dick Cheney.
Como se vê, credibilidade é uma mercadoria escassa. E o Brasil não está fora disso. Certos candidatos juram por todos os santos que vão respeitar os contratos das dívidas interna e externa e, ainda assim, o mercado financeiro duvida. Empresas e pessoas se desfazem de títulos públicos com medo de sofrer calote.
A credibilidade vai a zero também quando as pessoas mais atentas vêem partidos de origem socialista se coligando com partidos de origem liberal -líquidos imiscíveis- com o propósito único de vencer as eleições.
Isso não quer dizer que esses partidos tenham agendas conflitantes, porque os programas, quando existentes, são suficientemente genéricos para acomodar todos os gostos.
A adesão de líderes liberais às chapas de quem defendeu, no passado recente, idéias radicais e programas populistas não é menos confusa.
A sociedade entre os ex-combatentes da corrupção e os campeões da malversação dos recursos públicos indica, igualmente, o extremo do oportunismo que veio dominar a política brasileira.
Lembremos que o TSE tentou pôr um pouco de ordem na casa, proibindo coligações de contrários na linha vertical. Imaginem se isso não tivesse sido feito...!
O mundo e o Brasil vivem uma quadra de incredulidade. Essa situação não é boa para a economia nem, muito menos, para a política. Os seres humanos são racionais, mas se guiam também por atos de fé. Investidores e eleitores precisam ter um mínimo de confiança antes de tomar suas decisões.
Na incerteza e na descrença, o investimento é adiado e o voto é desperdiçado. Isso não pode e não deve acontecer. Cada um no seu canto tem a importante tarefa de agir de acordo com a sua consciência. Será um bom começo para restaurar a credibilidade. Menos teatro e mais sinceridade!


Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.

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