São Paulo, sábado, 14 de julho de 2007

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A energia nuclear é uma boa solução para o Brasil?

SIM

Por que não?

ODAIR DIAS GONÇALVES

A RESPOSTA é fácil: sim, pois o Brasil precisa de energia elétrica, e a energia nuclear tem preço competitivo, é segura e ambientalmente inócua. Uma usina a gás produz 446g de CO2 por kWh, uma a carvão, 955g, e a nuclear, apenas 4g. Ademais, o Brasil tem a sexta reserva de urânio do mundo, com apenas 30% de seu território. Isso significa que dispomos de reserva para muitas usinas por centenas de anos, fato de enorme importância estratégica. Podemos fazer a pergunta reversa: por que não? Opositores da energia nuclear alinham três argumentos: preço, segurança e rejeitos.
Sobre o preço, os estudos da EPE (Empresa de Pesquisa Energética) indicam custo em torno de R$ 138/ MWh, abaixo dos custos do gás e do carvão importado e muito abaixo dos custos da eólica (R$ 240) e da solar (R$ 1.798). A energia das duas últimas só pode ser estocada em baterias, custosas e agressivas ao ambiente. A recente decisão do CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) aprovando Angra 3 foi baseada em critérios técnicos e econômicos, e na mesma reunião se decidiu pela realização de auditoria independente para confirmação desse custo. O preço internacional da energia nuclear gira hoje em torno de R$ 140/MWh, corroborando os dados da EPE.
Sobre a segurança das usinas, houve até hoje só dois incidentes graves com reatores: Chernobyl (Ucrânia) e Three Milles Island (EUA). O primeiro jamais ocorreria com os reatores tipo PWR, o mais usado no Ocidente e adotado no Brasil, pois eles contemplam itens de segurança muito mais eficazes. Essa afirmação é comprovada pelo acidente em Three Milles Island (reator PWR), que provocou grande extensão de danos, mas sem uma única vítima nem vazamento de radiação para o ambiente.
Ressalte-se que a área nuclear é uma das poucas que, na maioria dos países, Brasil inclusive, exigem que as centrais nucleares incorporem novas medidas de segurança sempre que algum fato ocorrido em qualquer outra instalação, de qualquer parte do mundo, evidencie alguma fragilidade na segurança.
A última questão refere-se à gerência de rejeitos. É preciso esclarecer que eles se dividem em duas categorias: a primeira engloba os de média e baixa atividade -da área médica e da industrial e parte dos provenientes de usinas nucleares, como filtros de ar ou materiais que eventualmente tenham tido contato com material radioativo; a segunda diz respeito a rejeitos de alta atividade e constitui-se dos elementos combustíveis usados.
Já os depósitos se dividem em três categorias: iniciais (não são provisórios nem têm prazo de validade), sob responsabilidade do operador, intermediários e finais, a cargo da Cnen (Comissão Nacional de Energia Nuclear). A gerência de rejeitos é um problema em aberto em inúmeras atividades, por exemplo, indústria de plásticos, indústrias químicas, indústria médica, hospitais e mesmo o lixo residencial. A área nuclear é uma das poucas que equacionaram o problema, cuidando e armazenando cada grama de rejeito produzido.
Além disso, o volume de rejeitos de uma usina é extremamente reduzido se comparado a outras atividades. Os combustíveis usados gerados por uma usina nuclear de 1.000 MW, operando por 60 anos, equivalem a 1.500 m3. Ou seja, os resíduos de 20 usinas, em 60 anos, cabem em um campo de futebol escavado com cinco metros de profundidade.
No Brasil, os rejeitos de alta atividade produzidos pelas usinas são armazenados em piscinas na própria central nuclear, em segurança, e poderiam lá ficar por toda a vida útil da usina. E a Cnen e a Eletronuclear estão trabalhando num projeto de depósito definitivo, o qual deverá estar concluído até 2012. Como se vê, apesar do perigo associado ao material radioativo, o risco é facilmente controlável, como o prova o fato de nunca haver ocorrido, em nenhuma parte do mundo, nenhum acidente de monta com os depósitos.
Em resumo, não me parece haver dúvidas sobre se é uma boa solução ou não. Caberia a pergunta sobre qual seria nosso interesse em não adotar uma alternativa econômica, segura e ambientalmente limpa. O país merece esse debate.


ODAIR DIAS GONÇALVES, 55, mestre e doutor em física pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), é presidente da Cnen (Comissão Nacional de Energia Nuclear).

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