São Paulo, sábado, 14 de agosto de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

A túnica e os dados

RIO DE JANEIRO - No início do atual governo, insistentemente acusado de partidarizar a vida nacional, falou-se na obrigatoriedade da carteirinha do partido agora no poder para os candidatos a cargos públicos se habilitarem junto aos escalões superiores do partido.
Descontando-se os exageros, a mania prevaleceu e ainda prevalece, mitigada um pouco, porque há que satisfazer a base aliada, que também se julga com direito aos despojos, ao lance de dados com que os soldados romanos, aos pés da cruz, disputaram a túnica de Jesus. É bem verdade que a túnica era pequena e os soldados poucos, ao contrário dos cargos, que são muitos -e os candidatos são muitíssimos.
De qualquer forma, a carteirinha do partido não podia ser oficializada, era coisa doméstica do governo. Agora, com a pretendida criação do Conselho Federal de Jornalismo, o mesmo governo quer controlar as diversas mídias, numa operação que nem chega a disfarçar o caráter totalitário da pretensão dos atuais mandatários do poder.
Uma das verdades mais sovadas da política é que o assalto à democracia não começa com tanques e canhões, que muitas vezes nem são necessários. Começa com o cerceamento da imprensa, apesar dos desmandos que ela comete, tanto no setor da informação como no da opinião.
As leis vigentes no país dão aos prejudicados amplas garantias de reparação nos chamados crimes e abusos da imprensa. Não cabe ao governo ensinar ou policiar aqueles que estão legalmente habilitados ao exercício da profissão.
No caso do rádio e da TV, que são concessões do Estado, o controle já existe em lei e não precisa de um órgão suplementar para controlar ou manipular a informação. No caso dos jornais, que pertencem à iniciativa privada, a interferência do Estado só não chega a ser uma tolice porque pode ser o início de um crime.


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