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TENDÊNCIAS/DEBATES
Não viu e não gostou
LUIZ ROBERTO BARRADAS BARATA
Para o paciente, a questão de quem gerencia o
hospital é secundária.
O que realmente importa
é ser bem atendido
O DEBATE em torno da proposta
do governo federal de gestão
de hospitais públicos por fundações estatais de direito privado,
com orçamentos preestabelecidos,
contrato de metas e funcionários admitidos sob o regime da CLT, deve ser
conduzido, obrigatoriamente, sob a
ótica da melhoria da qualidade da
prestação de serviços aos usuários do
SUS (Sistema Único de Saúde).
Quando o cidadão adoece, é fundamental que lhe seja garantido atendimento ágil, prestado por profissionais capacitados, em unidades de saúde bem equipadas. Para o paciente, a
questão de quem gerencia o hospital é
secundária. O que realmente importa
é ser bem atendido e, se possível, ter
seu problema de saúde rapidamente
solucionado.
Em São Paulo e no país, há mais de
uma década hospitais são apoiados
por fundações privadas que os auxiliam a melhorar a gestão dos serviços
públicos de saúde oferecidos à população. São exemplos dessas parcerias
o Hospital das Clínicas de São Paulo,
o InCor, o Dante Pazzanese, o HC de
Ribeirão Preto e o Instituto Nacional
de Câncer, entre outros.
Pesquisa Datafolha realizada com
médicos e divulgada recentemente
apontou o HC de São Paulo entre os
quatro melhores hospitais da capital
paulista, ao lado de Albert Einstein,
Sírio Libanês e Oswaldo Cruz, todos
particulares. O Dante Pazzanese e o
InCor também ficaram bem posicionados no atendimento de cardiologia
-o que comprova, mais uma vez, a
qualidade dessas instituições e a importância das fundações de apoio.
A mudança proposta pelo Ministério da Saúde procura modernizar arcaicas e impróprias regras da gestão
pública que acabam permitindo a
preservação de privilégios, direitos
adquiridos e controle de meios em
detrimento, muitas vezes, dos objetivos finais das unidades de saúde, ou
seja, a garantia do atendimento de
qualidade aos usuários.
No Estado de São Paulo, há nove
anos se adotou um novo modelo de
gerenciamento de hospitais públicos
baseado em contratos de gestão entre
o governo e entidades filantrópicas
para administração de unidades de
saúde com metas de qualidade, quantidade e rapidez nos atendimentos.
Os resultados são extremamente
positivos. Atualmente, 19 hospitais
são gerenciados pelas chamadas OSs
(Organizações Sociais).
Em 2006, esses hospitais estaduais
internaram cerca de 90 mil pacientes
a mais do que essas mesmas unidades
atenderiam se estivessem sob administração direta -e com gasto R$ 240
milhões menor. Isto é, atenderam
mais gastando menos.
Nessas unidades, o índice de satisfação dos usuários chega a 95%. O
Banco Mundial apontou o modelo como exemplo viável e extremamente
positivo para a gestão de hospitais públicos na América Latina.
Certamente, como afirmou o presidente do Conselho Nacional de Saúde
nesta Folha ("Tendências/Debates",
27/8), se a administração pública estatal não vai bem, é preciso melhorá-la. Mas a área da saúde precisa de soluções urgentes e ousadas. Não se trata de burlar leis, mas de , modificando
e modernizando a legislação existente, criar novas formas de bem atender
ao cidadão. Atendimento público e
gratuito, mas não necessariamente
estatal.
É evidente que é preciso criar novos mecanismos de fiscalização e
controle para garantir a transparência da gestão do dinheiro público.
Já alertamos sobre a necessidade
de que os critérios estabelecidos para
a nomeação dos dirigentes e as avaliações dos serviços prestados pelas
novas fundações sejam absolutamente técnicos. Evitar ingerências de natureza político-partidária e garantir a
gerência profissional das novas fundações são elementos essenciais ao
sucesso da proposta federal.
No sistema de Organizações Sociais, a lei paulista prevê que uma entidade só poderá ser qualificada para
administrar um hospital do governo
se tiver, no mínimo, cinco anos de experiência na prestação de serviços de
saúde. A prestação de contas das OSs
é encaminhada ao Tribunal de Contas do Estado, à Assembléia Legislativa e a uma comissão composta por
membros do Conselho Estadual de
Saúde e da sociedade civil. Ou seja,
existe total transparência e controle
dos gastos públicos realizados.
Há bons motivos para acreditar
que o projeto de fundações estatais
do ministro da Saúde, José Gomes
Temporão, pode dar certo.
Tudo dependerá, evidentemente,
da maneira como esse processo for
conduzido. Não há dúvida, entretanto, de que é preciso inovar. Afirmar
que um projeto inspirado em modelos que já deram certo não será bem-sucedido, além de precipitado, é coisa
de quem "não viu e não gostou".
LUIZ ROBERTO BARRADAS BARATA, 54, médico sanitarista, é secretário da Saúde do Estado de São Paulo.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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