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ROBERTO MANGABEIRA UNGER
Que fazer?
O horizonte de um governo
eleito para mudar tudo restringiu-se cedo à combinação de pseudo-ortodoxia econômica com homenagens inócuas aos pobres. Como começar a reação e construir a alternativa?,
perguntam, perplexos, muitos. Com
que partidos e líderes? Alguns ainda
esperam que o governo se reoriente,
tangido pela ocorrência ou pela ameaça da derrota eleitoral. Outros já têm
por definitiva sua rendição, mais por
pequenez dos homens do que por imposição dos fatos. Os dois grupos enfrentam, porém, o mesmo imperativo
de ação. Se houver como mudar a direção do governo, não há de ser sussurrando nos ouvidos das poucas pessoas que o conduzem; é fazendo com
que a nação ouça outra voz e exija outro rumo.
Convém partir da correção de um
erro. Nos anos que antecederam a
eleição de 2002, insistiu-se em afirmar
a superioridade de candidaturas
apoiadas por grandes partidos sobre
outras supostamente personalistas ou
messiânicas. Os grandes partidos protagonizariam opções sólidas, fundadas na representação das forças organizadas da sociedade brasileira. E o
vínculo do candidato com tais partidos seria necessário para assegurar ao
governo eleito condição para governar.
Tudo falso. Os grandes partidos brasileiros não oferecem alternativas claras nem possuem bases fixas. Tanto
assim que o atual governo do PT -o
maior e mais organizado dos partidos- logo aderiu ao ideário da coalizão que acabara de derrotar. Esforçou-se por trocar de base, substituindo a pequena burguesia radicalizada e
organizada (que agora aponta como
vilã) por aliança entre os financistas e
os famintos. E entregou-se, em nome
do resguardo da hegemonia política,
ao fisiologismo a que se contrapusera.
Por outro lado, a história recente demonstra que, eleito o governo, os partidos, com poucas exceções, só militam na oposição quando não lhes sobra pretexto ou oportunidade para
aderir. Isso não quer dizer que regime
de partidos e elenco de alternativas
não sejam indispensáveis ao país. O
problema é como chegar lá: não chegaremos fingindo que já chegamos.
A solução é aceitar o Brasil como ele
é para poder transformá-lo. A primeira preocupação dos que quiserem hoje construir alternativa não deve ser
fundar partidos ou negociar com eles.
Deve ser reunir gente na sociedade civil -e sobretudo entre todos os que se
identificam com os interesses do trabalho e da produção- em torno de
propostas simples, práticas e arrojadas para soerguer o país. Hipotecada a
televisão ao governo, é inevitável que
esse processo comece dentro das minorias da classe média politizada que
continuam a ser o centro de gravidade
da política brasileira. A prática de resistência, de instigação e de persuasão
formará líderes e organizações. A
mensagem, abafada no início, acabará
por se fazer ouvir. O eleitorado encontrará a quem se voltar; não terá de escolher entre as vertentes petista e tucana do mesmo projeto malogrado.
Nessa hora, surgirá de repente a base
partidária da alternativa.
Não é partido que nos falta para trilhar esse caminho áspero. O que nos
falta é ânimo. Se não pudermos atuar
por esperança, que atuemos por indignação. Esperança, tal qual partido,
virá depois.
Roberto Mangabeira Unger escreve às terças-feiras nesta coluna.
www.law.harvard.edu/unger
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