São Paulo, sábado, 15 de janeiro de 2011

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HÉLIO SCHWARTSMAN

Mitos do desastre

SÃO PAULO - Os norte-americanos podem ser acusados de várias coisas, mas não de falta de pragmatismo. Não há fenômeno social grande ou pequeno sobre o qual eles não tenham tentado erigir uma ciência. A Wikipedia lista nada menos do que 89 subcampos da sociologia. São coisas como sociologia do consumo, do crime, da internet, do filme e, como não poderia deixar de ser, a sociologia do desastre.
Assim, mais ou menos desde os anos 20, parte dos cientistas sociais dos EUA se dedica a observar e mensurar como as pessoas reagem em situações de catástrofes e emergências naquele país. Chegaram a algumas conclusões interessantes que, se são válidas para o Brasil, ganham atualidade com a tragédia na região serrana do Rio de Janeiro.
A primeira delas é que, ao contrário do que sugere o senso comum, vítimas costumam reagir com racionalidade aos acontecimentos. Pânico contagiante, fuga em massa, saques, ainda que possam ocorrer de forma esporádica, constituem o que autores como Enrico Quarantelli e Henry Fisher chamam de "mitolologia do desastre". Emergências, dizem, tendem a despertar o altruísmo das pessoas, não o lobo hobbesiano que existe dentro de cada um de nós.
Outro ponto importante é que vítimas e autoridades frequentemente se comportam como se evitar saques e violência fosse uma prioridade. Com isso, podem tomar decisões erradas, como permanecer numa casa condenada e desviar recursos para um policiamento provavelmente desnecessário.
Parte da culpa, diz Fisher em seu "Response to disaster", é da mídia. Após tabular 40 anos de cobertura jornalística de catástrofes, ele conclui que os meios de comunicação seguem perpetuando os mitos, mesmo que sem evidências empíricas para ampará-los.
A situação, entretanto, pode estar melhorando. Hoje já quase não se publicam mais histórias de saqueadores que cortam os dedos dos mortos para ficar com seus anéis.


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