São Paulo, sexta-feira, 15 de fevereiro de 2002

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Direitos humanos das vítimas

ALEXANDRE DE MORAES

A proteção aos direitos humanos das vítimas e seus familiares e a multiplicação da noção de cidadania são fatores essenciais à solidificação de um Estado democrático de Direito.
Os direitos humanos devem ser entendidos como aqueles direitos fundamentais da pessoa humana, considerada tanto em seu aspecto individual como comunitário, que correspondem a esta em razão de sua própria natureza (de essência ao mesmo tempo corpórea, espiritual, social) e que devem ser reconhecidos e respeitados por todo poder e autoridade, e relacionando-se diretamente com a consagração da dignidade humana.
O respeito aos direitos humanos fundamentais é pilastra mestra na construção de um verdadeiro Estado de Direito democrático e sua constitucionalização não significa mera enunciação formal de princípios, mas a plena positivação de direitos, a partir dos quais qualquer indivíduo poderá exigir sua tutela ante o Poder Judiciário, para a concretização do Estado democrático de Direito.
A previsão dos direitos humanos fundamentais direciona-se basicamente para a proteção à dignidade humana em seu sentido mais amplo, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar.
Nesse diapasão, a Constituição Federal prevê que a lei disporá sobre as hipóteses e condições em que o poder público dará assistência aos herdeiros e dependentes carentes de pessoas vitimadas por crime doloso, sem prejuízo da responsabilidade civil do autor do ilícito (art. 245).
O governo do Estado de São Paulo, em fiel observância ao mandamento constitucional, enfatiza, por meio do Cravi (Centro de Referência e Apoio à Vítima), órgão da Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania, os objetivos específicos de proteção aos direitos humanos das vítimas e seus familiares, prestando atendimento psicológico, jurídico e social, identificando os perfis da violência atual e formas de prevenção, identificando e combatendo os efeitos traumáticos provenientes da violência sofrida pelas vítimas e por suas famílias.
O Centro de Referência e Apoio à Vítima constitui um programa da Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania, em parceria com a Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social, a Procuradoria Geral do Estado, o Ministério da Justiça, o Núcleo de Violência e Justiça da Faculdade de Serviço Social da PUC, o Instituto Sou da Paz, entre outras organizações, que busca a efetiva proteção dos direitos fundamentais das vítimas e seus familiares.


O respeito aos direitos humanos fundamentais é pilastra mestra de um verdadeiro Estado de Direito democrático


O Cravi presta atendimento psicológico, jurídico e social às vítimas de crimes violentos, consumados ou tentados, como homicídios, latrocínios e outros casos de graves violências, sendo que, desde sua fundação, em julho de 1998, forneceu atendimento presencial e continuado a mais de 3.000 pessoas, das quais aproximadamente 70% são mulheres de baixa renda, esposas ou mães de pessoas assassinadas.
Atualmente, encontra-se em fase de implantação na Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania o Projeto Criança -Vida, para o atendimento diferenciado às crianças e aos jovens vítimas de violência urbana.
Além disso, a secretaria vem intensificando a atuação do Cravi, como maneira de auxiliar na ruptura de ciclos e códigos de violência existentes na família; bem como buscando auxiliar na reconstrução da vida daquelas famílias e na noção de cidadania e direitos que possa ser multiplicada por cada família em sua comunidade.
Também estão sendo intensificados os trabalhos de multiplicação protetiva dos direitos das vítimas, mediante a orientação a diversos municípios interessados, que, por meio de convênios, poderão implantar os Centros Regionais de Apoio à Vítima, que receberão do Cravi o necessário suporte técnico para o desenvolvimento do projeto e acompanhamento posterior.
A proteção dos direitos fundamentais das vítimas e seus familiares, bem como a multiplicação da noção de cidadania, é fator essencial para a construção de uma sociedade mais justa e democrática, pois, como afirmou Cícero, "somente se o povo sabe preservar seus direitos, estaremos diante de um regime político incomparavelmente mais maravilhoso, mais livre e mais feliz, pois ele é senhor das leis, da justiça, da guerra, da paz, dos acordos, da vida e dos bens de cada cidadão. Somente assim pode-se usar, com toda a propriedade a palavra "república", isto é, a coisa do povo".


Alexandre de Moraes, 33, doutor em direito do Estado pela USP, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, é secretário da Justiça e Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo.



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