São Paulo, terça-feira, 15 de julho de 2008

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Editoriais

Agitação institucional

Se é precipitado falar de crise na Justiça no caso Dantas, há um certo belicismo retórico que deveria ser evitado

OS MEIOS jurídicos se agitam mais que o habitual em torno da Operação Satiagraha, da Polícia Federal. Alguns dizem que o vulto adquirido a partir do choque entre o juiz responsável pelo caso, Fausto De Sanctis, e o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, já permite falar em crise no Judiciário.
A avaliação é no mínimo precipitada, pois até aqui nada no episódio afetou o trâmite da Justiça. O juiz federal agiu dentro de sua prerrogativa quando, no controle da ação policial, decretou dois mandados de prisão -o primeiro, de detenção provisória; o segundo, de preventiva- contra o banqueiro Daniel Dantas.
O mesmo se pode afirmar sobre a atuação de Gilmar Mendes, ministro de plantão durante o recesso do Supremo, incumbido de decidir sobre recursos urgentes nesse período. Ao conceder duas vezes o habeas corpus -garantia dos cidadãos contra abusos de autoridade inscrita na Constituição, da qual o STF é o guardião máximo-, Mendes também cumpriu seu papel.
A democracia foi concebida para acomodar, numa ordem institucional preestabelecida, a conflitividade da vida social. No sistema de pesos e contrapesos, o poder da autoridade é sempre relativo, pois está submetido ao crivo de outras instâncias. É apenas corriqueiro, pois, que haja conflito entre a decisão de um juiz federal de primeira instância e a de um ministro do STF -e que a ordem deste prevaleça.
Excluir a hipótese de crise na Justiça, porém, não significa deixar de questionar o belicismo retórico e a precipitação tática de personagens do caso. A atitude do delegado que conduz o inquérito de pedir a prisão preventiva do banqueiro logo após ele ter sido solto e a do juiz que a decretou soaram como provocação.
O ministro Gilmar Mendes, por seu turno, fez um registro, que depois disse ser para mero controle estatístico, do mandado expedido por De Sanctis no Conselho Nacional de Justiça, órgão de controle externo para fins apenas administrativos, que não pode ser invocado para questionar o teor da decisão soberana de um magistrado. A ofensiva provocou forte reação no meio jurídico. Os mais exaltados falam em pedir o impeachment de Mendes, o que seria absurdamente desproporcional.
Um outro ministro, este do Executivo, também agiu como incendiário. Em entrevista à Folha, Tarso Genro despiu-se mais uma vez do protocolo que recomenda aos titulares da pasta da Justiça a máxima isenção sobre processos em andamento. Pôs-se a avaliar a chance de o banqueiro escapar da condenação.
É do interesse público que as autoridades investidas do poder de Estado dediquem-se a cumprir seu papel institucional com denodo. Deveriam preocupar-se, igualmente, em evitar celeumas que apenas dissipam energia.


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