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FORMAÇÃO MÉDICA
Afirmar que más escolas tendem a formar maus profissionais é um truísmo. Ainda assim, um
interessante estudo patrocinado pelo
Conselho Regional de Medicina de
São Paulo (Cremesp) praticamente
demonstra que o descontrole sobre a
criação e a manutenção de escolas
médicas está comprometendo a qualidade do atendimento à população.
Segundo o trabalho, a taxa de denúncias contra médicos formados
nas faculdades com as piores notas
no último exame de alunos foi mais
do que o dobro da registrada para as
instituições mais bem avaliadas.
Com efeito, em duas escolas que receberam nota 3, a pior do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes, realizado em 2004, o índice de
denúncias por cada grupo de 100 mil
médicos em atividade por ano foi de
1.680. Nas faculdades que obtiveram
nota 5, essa taxa cai para 821.
É claro que nem toda denúncia
apresentada se revela procedente. E
nem toda falha de um médico tem
origem em deficiências de formação.
Muitos dos processos éticos abertos
no Conselho dizem respeito a problemas de conduta, como abandono
de paciente e assédio sexual.
Ainda assim, a diferença de 100%
no índice das piores quando comparado ao das melhores é altamente sugestiva. A preocupação do poder público aqui deve ser com a saúde da
população, que não pode ficar à mercê de arapucas que despejam hordas
crescentes de maus profissionais no
mercado. É dever do Estado zelar pela formação de médicos que, ao concluir o curso, recebem o aval do Ministério da Educação para atuar.
Nesse contexto, tornam-se especialmente preocupantes os dados relativos à abertura de novas faculdades de medicina. Do início do século
19 até 1999, apenas 96 escolas de medicina surgiram no país. De 2000 para cá, porém, foram abertos quase 50
novos cursos, boa parte dos quais
sem infra-estrutura adequada para a
aprendizagem. Em São Paulo, o Cremesp estima que sejam inadequados
50% dos 229 serviços de saúde utilizados como local de ensino por 23
das 29 faculdades do Estado.
Para agravar o quadro, o país não
precisa de tantos médicos. A Organização Mundial da Saúde recomenda
que exista um médico para cada mil
habitantes. O Brasil conta hoje com
um profissional para cada grupo de
cerca de 700 pessoas.
O problema são os desequilíbrios
regionais. Enquanto no Estado do
Rio de Janeiro existe um médico para
cada 284 habitantes, no Pará o índice
é de 1.220. Parece mais lógico -e
menos dispendioso- tentar resolver o problema oferecendo salários e
condições de trabalho atraentes nas
áreas onde há carência do que aumentar o número de profissionais
até criar uma superoferta. Essa estratégia tende a ser mais grave quando
se verifica que o controle sobre a qualidade dos cursos é precário.
A situação é crítica e constitui
ameaça potencial à saúde pública.
Como o Estado vem se mostrando
incapaz de controlar o problema, parece cada vez mais inevitável que os
Conselhos adotem provas de qualificação e só aceitem como médicos os
bacharéis que demonstrem ter condições técnicas para tal.
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