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MARINA SILVA
Ainda tem
pés de barro
O GOVERNO enviou ao Congresso Nacional, no último
dia 11, a Medida Provisória
458, que trata da regularização
fundiária da Amazônia, após confuso processo de discussão entre os
ministérios e de insuficiente participação da sociedade.
O assunto é indiscutivelmente
prioritário, pois os objetivos de justiça social, redução da violência no
campo e combate ao desmatamento passam por essa regularização,
aliás, já prevista no Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia e no Programa
Amazônia Sustentável.
No entanto, sem as devidas correções, ela traz riscos. O de legalizar condutas criminosas, como a
grilagem de terras públicas, e o de
favorecer novo ciclo de expansão
da fronteira predatória.
A MP é positiva ao estabelecer
condicionantes ambientais para a
obtenção do título definitivo da
área ocupada e incluir ressalvas de
ordem social e ambiental, respeitando áreas previstas para a criação de unidades de conservação e
florestas públicas. Ao mesmo tempo, alegam-se dificuldades administrativas para dispensar vistoria
prévia de ocupações de até 400
hectares, o que é temerário.
O maior problema está na possibilidade de, ao largo do princípio
constitucional do interesse público
e da função social da terra, privatizar grandes áreas. Até 2004, só era
possível vender terras públicas de
até 100 hectares na Amazônia. Em
2005, esse limite passou para até
500 hectares. Em 2008, outra medida provisória permitiu a venda
de até 1.500 hectares, sem licitação. Agora, a nova MP permite regularizar essas grandes ocupações,
na maioria fruto de grilagem de
terras públicas, associada à violência e expansão do desmatamento.
A MP precisa de importantes
ajustes que só ocorrerão se o Congresso debater o assunto para valer. Centenas de emendas deverão
ser apresentadas, dada a gama de
interesses em jogo. A base do governo tem o dever político e ético
de, no mínimo, sustentar as ressalvas à transferência indiscriminada
de terra pública, mas também precisa negociar correções para pôr
freio ao erro histórico de premiar a
ilegalidade. É preciso separar posseiros de grileiros, quem tem direitos legítimos de quem atua contra a
legalidade.
Também é fundamental prever a
criação de novos mecanismos de
controle e participação da sociedade na gestão do processo de regularização. Uma vez ajustada, e dentro
de uma estratégia de ordenamento
territorial, a MP tem tudo para se
tornar instrumento de promoção
do desenvolvimento sustentável
da região, pondo fim à cultura do
fato consumado e dos incentivos à
expansão predatória da fronteira
de ocupação.
contatomarinasilva@uol.com.br
MARINA SILVA escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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