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CIÊNCIA DA MODA
A ciência, como qualquer outra atividade humana, está sujeita a modismos. Mais um que alertou para esse problema foi o farmacólogo Sérgio Henrique Ferreira, da
USP. Ferreira é uma sumidade no
mundo médico. Por suas pesquisas
em dor e em hipertensão, tornou-se
há pouco o quarto brasileiro a ser
eleito para a prestigiosa Academia
Nacional de Ciências dos EUA.
Em entrevista à Folha, Ferreira foi
direto ao criticar a Fapesp (Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo) pela ênfase excessiva que
dá a projetos ligados à genômica.
Não se trata de uma crítica apressada. Ferreira reconhece que essa linha
de investigação teve sua importância.
A Fapesp obteve grande -e justo- sucesso internacional com o sequenciamento do genoma da bactéria Xylella fastidiosa, causadora do
amarelinho que ataca laranjais, o que
pode ter levado a agência a superestimar essa linha de pesquisa. Provocador, Ferreira diz que fazer genoma
não é fazer ciência, mas meia ciência. Trabalhar com genômica, diz,
não envolve hipóteses nem resolve
problemas. A questão que Ferreira
coloca faz sentido: será que, para
descobrir e solucionar um problema
provocado por um gene, é necessário
decifrar todo o genoma humano?
Pode-se ir ainda mais longe. Tome-se o caso das doenças cardiovasculares, a primeira causa de morte no
Brasil. Os principais fatores de risco
para essas moléstias são colesterol
elevado, tabagismo, hipertensão,
obesidade e sedentarismo. São todos
fatores essencialmente ambientais,
ainda que a história familiar, genética, possa ter, em maior ou menor
grau, influência sobre eles.
Não resta dúvida de que a genômica, a possibilidade de entender -e
eventualmente curar- doenças em
seu nível mais primordial, é promissora. A sabedoria está em ser capaz
de enxergar as coisas para além de
modismos e equilibrar os investimentos. Sem perder de vista as promessas, é preciso também manter as
pesquisas que visam ao aqui e agora.
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