São Paulo, terça-feira, 16 de julho de 2002

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CIÊNCIA DA MODA

A ciência, como qualquer outra atividade humana, está sujeita a modismos. Mais um que alertou para esse problema foi o farmacólogo Sérgio Henrique Ferreira, da USP. Ferreira é uma sumidade no mundo médico. Por suas pesquisas em dor e em hipertensão, tornou-se há pouco o quarto brasileiro a ser eleito para a prestigiosa Academia Nacional de Ciências dos EUA.
Em entrevista à Folha, Ferreira foi direto ao criticar a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) pela ênfase excessiva que dá a projetos ligados à genômica. Não se trata de uma crítica apressada. Ferreira reconhece que essa linha de investigação teve sua importância.
A Fapesp obteve grande -e justo- sucesso internacional com o sequenciamento do genoma da bactéria Xylella fastidiosa, causadora do amarelinho que ataca laranjais, o que pode ter levado a agência a superestimar essa linha de pesquisa. Provocador, Ferreira diz que fazer genoma não é fazer ciência, mas meia ciência. Trabalhar com genômica, diz, não envolve hipóteses nem resolve problemas. A questão que Ferreira coloca faz sentido: será que, para descobrir e solucionar um problema provocado por um gene, é necessário decifrar todo o genoma humano?
Pode-se ir ainda mais longe. Tome-se o caso das doenças cardiovasculares, a primeira causa de morte no Brasil. Os principais fatores de risco para essas moléstias são colesterol elevado, tabagismo, hipertensão, obesidade e sedentarismo. São todos fatores essencialmente ambientais, ainda que a história familiar, genética, possa ter, em maior ou menor grau, influência sobre eles.
Não resta dúvida de que a genômica, a possibilidade de entender -e eventualmente curar- doenças em seu nível mais primordial, é promissora. A sabedoria está em ser capaz de enxergar as coisas para além de modismos e equilibrar os investimentos. Sem perder de vista as promessas, é preciso também manter as pesquisas que visam ao aqui e agora.


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