São Paulo, segunda-feira, 16 de agosto de 2004 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Educação na fila de espera EDUARDO PORTELLA
Entra governo, muda governo,
mudam-se os tempos e a educação
não muda. Continua mais ou menos a
mesma, apesar dos discursos triunfalistas de eventuais dirigentes. Não diria
que a educação está na UTI, mas que
pode ser vista no corredor do hospital
esperando atendimento, isso é evidente,
e há muitos anos. Não são só os pais e os
filhos que se encontram nas filas de espera das escolas de todos os lados e de
todos os níveis. É a própria educação
-abandonada umas vezes, desestimulada outras, desmotivada quase sempre.
As universidades, sobretudo públicas, parecem abandonadas ou entregues aos riscos dos terrenos baldios. A universidade já foi universidade da consciência e, conforme os ditames da época, encarnou os grandes ideais da humanidade. Foi em seguida a universidade do trabalho, e quase se transformou numa escola técnica, destinada a atender às estritas demandas do mercado. Mais recentemente, quando se preparava para ser também uma entidade cidadã e propositiva, foi seqüestrada ou entregue às baratas. Francamente, no caso específico, não sei o que é pior: se o seqüestro ou a entrega às baratas. É natural, portanto, que professores salarialmente aviltados, alunos desencantados, funcionários marginalizados estejam inconformados. Tudo isso em meio a instalações e equipamentos em geral estragados, laboratórios e bibliotecas inviáveis. Daí os efeitos perversos do sistema revelados, por exemplo, nos "diplomas de aluguel", expressão tão bem cunhada, aqui na Folha, por Gilberto Dimenstein, a propósito das avessas faculdades de direito. Fenômeno, como ele próprio alerta, que se estende a outras áreas profissionais. O Estado necessita se convencer de que cabe priorizar a educação, numa escala sensata de investimentos públicos. Ou seja, nem perdulária, nem mesquinha. Em vez de investir no marketing, conviria canalizar esses recursos para empreendimentos educacionais. O marketing vem a ser a produção de verdades falsas, e o marqueteiro o subproduto do puro capital financeiro. O marqueteiro não é apenas uma individualidade reclusa, porém um estado de espírito que, contaminado, contamina com freqüência preocupante os verdadeiros gestores públicos. O ensino, ao contrário do comércio, vive de não se expor, de saber e ensinar quase silenciosamente. Mas essa é outra história, e fica para outra vez. Agora é a hora e a vez da educação. Eduardo Portella, 71, escritor e professor emérito da UFRJ, é presidente do Comitê Caminhos do Pensamento, da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) e membro da Academia Brasileira de Letras. Foi ministro da Educação, Cultura e Esportes (governo João Figueiredo), diretor-geral-adjunto da Unesco (1988-1993) e presidente da Conferência Geral da Unesco (1997-1999). Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Arnaldo Niskier: Identidade cultural: língua e soberania Índice |
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