São Paulo, segunda, 17 de fevereiro de 1997.

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A luta pela vida no Pontal



Caso não seja dada uma atenção especial, corremos o risco de ver tragédias como a de Corumbiara
EDUARDO MATARAZZO SUPLICY Na semana passada, estive durante quatro dias no Pontal do Paranapanema, visitando acampamentos de sem-terra. Encontrei-me, também, com fazendeiros, para ouvir suas preocupações e as sugestões que apresentam para resolver um problema social que reconhecem como grave. Desde que comecei a acompanhar diretamente a luta desses trabalhadores, nos anos 70, nunca havia sentido um clima tão forte de tensão.
Caso não seja dada uma atenção especial, corremos o risco de assistir, no Pontal, a tragédias como as de Corumbiara e Eldorado do Carajás.
Na última quinta-feira, participei, junto com as deputadas Marta Suplicy e Zulaiê Cobra, de sucessivas reuniões patrocinadas pelo secretário de Justiça, Belisário dos Santos Jr., e pelo prefeito de Presidente Prudente, Mauro Bragato. Dialogamos com cerca de 70 produtores rurais; depois, com 18 prefeitos; em seguida, com trabalhadores assentados; finalmente, com a coordenação do MST.
Nos acampamentos, conversei, mais uma vez, com pessoas que desde criança trabalham na roça. Muitos foram bóias-frias que, nos últimos tempos, vêm tendo dificuldade crescente de conseguir emprego com remuneração suficiente para permitir vida digna. Daí por que fizeram a opção de participar daqueles acampamentos, onde a precariedade de condições de vida é compensada pela solidariedade na luta pela terra.
Os produtores rurais compreendem a necessidade de chegar a uma solução para a estrutura fundiária, mas querem que o governo aja com maior rapidez, especialmente no que se refere à garantia da segurança de suas fazendas.
Declaram-se "obrigados a contratar seguranças armados". Alguns dizem que só não houve até agora mortes no Pontal porque "somos ruins de tiro". Pedem o cadastramento dos sem-terra e a colocação de barreiras nas estradas para evitar a chegada de mais trabalhadores. Dizem que, com a intranquilidade na região, não estão podendo realizar investimentos para expansão ou mesmo melhoria de suas atividades. Sugerem que o Incra faça levantamento comparativo do aproveitamento de suas terras e das terras dos assentamentos.
Dos prefeitos ouvi que, depois dos assentamentos, as pequenas e médias cidades experimentaram maior movimentação do comércio e da atividade econômica em geral. De acordo com o Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp), em 12 fazendas, onde antes se empregavam 50 pessoas, hoje estão assentadas 1.000 famílias, gerando 3.000 empregos diretos.
Os prefeitos da região estão muito angustiados com a situação. Estão dispostos a ser os catalisadores de um acordo entre os fazendeiros e os trabalhadores.
O MST voltou a dizer que as ocupações têm apenas a finalidade de mostrar a urgência da reforma agrária. Denunciou arbitrariedades que vêm sendo cometidas pela Polícia Civil. Apesar disso, o MST não vem aceitando provocações que possam levar a tragédias.
A coordenação do MST resolveu aceitar e até estimular a proposta dos fazendeiros de que seja feita vistoria em assentamentos como os da gleba 15 e os das fazendas São Bento, Nossa Senhora de Fátima e Rebojo, pois têm a convicção de que o aproveitamento dessas terras é hoje superior ao que se observava antes dos assentamentos.
Belisário dos Santos Jr. anunciou que apresentará de forma definitiva decreto que permitirá agilizar a negociação com os produtores rurais que estejam dispostos a ceder parcela de suas áreas -quase todas de origem problemática-, aumentando, assim, o estoque de terras para assentamentos.
Apesar do clima de tensão, continuou convencido de que ainda é possível um entendimento entre os proprietários rurais e os sem-terra, com a participação dos prefeitos da região, de parlamentares de São Paulo e dos governos estadual e federal.
Mas o tempo conspira contra nós. O quadro que presenciei nos últimos dias é suficientemente grave para que o presidente Fernando Henrique Cardoso e o governador Mário Covas se disponham a vir pessoalmente ao Pontal, de modo a contribuir para a superação dos problemas da região. Se não o fizerem logo, talvez sejam obrigados a comparecer para expressar condolências a famílias enlutadas.
Eduardo Matarazzo Suplicy, 55, é senador pelo PT de São Paulo, doutor em economia pela Universidade Estadual de Michigan (EUA) e professor de economia da Fundação Getúlio Vargas (SP).

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