São Paulo, domingo, 17 de abril de 2011

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Paradoxo inquietante

Países ricos convalescem da crise, enquanto emergentes se debatem com aquecimento e todos padecem com a alta no preço das commodities

Há menos de dois meses, as expectativas eram de que 2011 seria um ano francamente positivo para a economia global. Predominava a avaliação de que a recuperação das economias desenvolvidas avançaria bastante.
Com isso, a cicatrização das feridas abertas pela crise do período entre 2007 e 2009 -virtual quebra de grande parcela do sistema financeiro, alta dramática do desemprego, salto do endividamento dos governos- tenderia a se acelerar. A crise financeira, enfim, poderia começar a ser vista como tema do passado.
Esse otimismo arrefeceu bastante nas últimas semanas. Dois eventos não econômicos, a onda de instabilidade política no mundo árabe e o terremoto no Japão, foram o estopim da piora de expectativas. As pressões inflacionárias, até então adormecidas nas economias desenvolvidas e em geral sempre incômodas nas demais, recrudesceram.
Num quadro em que a ociosidade das máquinas e da mão de obra ainda é alta, o que tem empurrado a inflação são as matérias-primas. O petróleo representa só parte da história: diante do receio de perturbações na oferta e da perspectiva de reforço da demanda na esteira do programa de reconstrução japonês, o preço do barril, que pelos padrões históricos já se achava elevado, saltou de US$ 90 para US$ 110, e lá se acomodou.
A menor confiança no vigor e mesmo na continuidade da retomada nos países ricos poderia, em tese, abalar as cotações das demais commodities. Mas não é o que se vem verificando.
No caso dos metais, a demanda começou o ano fortalecida, dando sustentação a cotações salgadas, graças ao dinamismo das economias emergentes. Mais recentemente, a perspectiva de demanda aquecida se renovou, por força do caso japonês. Hoje, o principal índice de preços de metais se situa quase 20% acima do recorde histórico prévio, em meados de 2008.
Também os alimentos sustentam nível de preço sem precedentes, 10% mais alto que o pico no meio do ano de 2008 (e perto de 50% acima da média de 2009).
É evidente que o fortalecimento da demanda, sobretudo nos emergentes, tem parcela de responsabilidade por cotações tão altas. Mas é inegável o papel da especulação, numa conjuntura singular em que os juros seguem próximos de zero nas principais praças financeiras internacionais -e, portanto, escasseiam alternativas atraentes de aplicação financeira.
Esse quadro paradoxal -desenvolvidos convalescentes, emergentes aquecidos, cotações de commodities ensandecidas- guarda evidente potencial de instabilidade. E é inquietante constatar que, passado o momento em que a premência de estancar o pânico financeiro amorteceu as divergências, a coesão política nos países desenvolvidos dá sinais de erosão, como evidenciam o embate parlamentar sobre o Orçamento federal nos EUA e a resistência alemã a financiar o rombo nas contas de vários países da região.


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