|
Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
Editoriais
editoriais@uol.com.br
Paradoxo inquietante
Países ricos convalescem da crise, enquanto emergentes se debatem com aquecimento e todos padecem com a alta no preço das commodities
Há menos de dois meses, as expectativas eram de que 2011 seria
um ano francamente positivo para
a economia global. Predominava
a avaliação de que a recuperação
das economias desenvolvidas
avançaria bastante.
Com isso, a cicatrização das feridas abertas pela crise do período
entre 2007 e 2009 -virtual quebra
de grande parcela do sistema financeiro, alta dramática do desemprego, salto do endividamento dos governos- tenderia a se
acelerar. A crise financeira, enfim,
poderia começar a ser vista como
tema do passado.
Esse otimismo arrefeceu bastante nas últimas semanas. Dois
eventos não econômicos, a onda
de instabilidade política no mundo árabe e o terremoto no Japão,
foram o estopim da piora de expectativas. As pressões inflacionárias, até então adormecidas nas
economias desenvolvidas e em
geral sempre incômodas nas demais, recrudesceram.
Num quadro em que a ociosidade das máquinas e da mão de obra
ainda é alta, o que tem empurrado
a inflação são as matérias-primas.
O petróleo representa só parte da
história: diante do receio de perturbações na oferta e da perspectiva de reforço da demanda na esteira do programa de reconstrução japonês, o preço do barril, que
pelos padrões históricos já se
achava elevado, saltou de US$ 90
para US$ 110, e lá se acomodou.
A menor confiança no vigor e
mesmo na continuidade da retomada nos países ricos poderia, em
tese, abalar as cotações das demais commodities. Mas não é o
que se vem verificando.
No caso dos metais, a demanda
começou o ano fortalecida, dando
sustentação a cotações salgadas,
graças ao dinamismo das economias emergentes. Mais recentemente, a perspectiva de demanda
aquecida se renovou, por força do
caso japonês. Hoje, o principal índice de preços de metais se situa
quase 20% acima do recorde histórico prévio, em meados de 2008.
Também os alimentos sustentam nível de preço sem precedentes, 10% mais alto que o pico no
meio do ano de 2008 (e perto de
50% acima da média de 2009).
É evidente que o fortalecimento
da demanda, sobretudo nos emergentes, tem parcela de responsabilidade por cotações tão altas.
Mas é inegável o papel da especulação, numa conjuntura singular
em que os juros seguem próximos
de zero nas principais praças financeiras internacionais -e, portanto, escasseiam alternativas
atraentes de aplicação financeira.
Esse quadro paradoxal -desenvolvidos convalescentes,
emergentes aquecidos, cotações
de commodities ensandecidas-
guarda evidente potencial de instabilidade. E é inquietante constatar que, passado o momento em
que a premência de estancar o pânico financeiro amorteceu as divergências, a coesão política nos
países desenvolvidos dá sinais de
erosão, como evidenciam o embate parlamentar sobre o Orçamento
federal nos EUA e a resistência
alemã a financiar o rombo nas
contas de vários países da região.
Próximo Texto: Editoriais: Um enigma chinês
Índice | Comunicar Erros
|