São Paulo, segunda-feira, 17 de maio de 2004 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Brasil paralelo
EMERSON KAPAZ
Com maior ou menor intensidade, a ilegalidade vem crescendo continuamente. O elo em comum no universo da ilegalidade é a magnitude da carga tributária. Há outros impasses, a exemplo da burocracia, da morosidade do Judiciário e da inflexibilidade das leis trabalhistas. Mas o que nutre e dá oxigênio a esse Brasil paralelo é o diferencial competitivo dos tributos sonegados. Em geral, países em desenvolvimento têm carga tributária corresponde a 25% do PIB. Nos países desenvolvidos, costuma haver mais cinco pontos percentuais na relação tributos/PIB. Entre nós, apenas na década de 90 saltou-se de 14% para cerca de 35% do PIB, quando países como Japão, Cingapura, Taiwan e Coréia do Sul trilharam o caminho inverso. Em lugar de altos impostos, buscaram consolidar um sistema que combina impostos relativamente baixos, regulamentação flexível e pequena e um sistema Judiciário forte para execução das leis. Colheram o que nós deveríamos estar colhendo: baixa informalidade e alta produtividade. Situação análoga aconteceu no passado com países hoje desenvolvidos. É preciso que todos percebam que o drama da elevada carga tributária produz conseqüências que vão muito além da crescente sonegação de impostos. Além de aprisionar a economia na camisa-de-força do não-crescimento, encurrala a sociedade com a praga da corrupção, incentiva a cultura das práticas ilegais como diferencial competitivo e, o que é igualmente nocivo, golpeia duramente aqueles que acreditam em práticas empresariais saudáveis. Trata-se de uma nuance que também precisa ser mais bem avaliada. A ação combinada dos juros altos, da crescente burocracia, da morosidade da Justiça é cada vez mais ameaçadora para o empreendedor. O desenvolvimento brasileiro, a despeito da forte presença do Estado, sempre teve o seu motor na iniciativa privada. Desde o barão de Mauá, a figura do empresário está intimamente associada à produção e criação de riquezas, enfim, ao progresso, que é o caminho mais curto para a geração de empregos e solução dos problemas sociais. O empresário nos dias atuais é um personagem ameaçado e sem estímulos. A formidável malha de legislações restritivas e a concorrência desleal fecham as janelas das oportunidades que deveriam se abrir após uma década de estabilização da moeda. Recentemente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva veio a público admitir que o governo errou nas modificações introduzidas na Cofins. Foi uma atitude corajosa, sem dúvida, mas não deixa de ser reveladora dos impasses da atualidade. Há uma década discute-se a reforma tributária. No momento em que se dá um tímido passo inicial para tirá-la do papel, constata-se que ele está errado. A conclusão é que chegou a hora das soluções reais. Além de esmiuçar os problemas, as autoridades precisam efetivamente empenhar-se para superá-los em harmonia com o empresariado e a sociedade. Como forma de cooperação, o Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial vem aprofundando estudos em parceria com a McKinsey, que serão divulgados nas próximas semanas, para radiografar causas e impactos profundos do Brasil paralelo no Brasil legal e formal. É uma forma otimista de apostar nas mudanças. O desafio é difícil de vencer. Difícil, mas não impossível. No fundo, o êxito do combate ao Brasil paralelo e a revitalização do Brasil legal e formal é muito menos uma decorrência da complexidade do problema do que uma questão de articulação, vontade e competência. Emerson Kapaz, 49, é presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial. Foi secretário da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo (governo Covas). Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Alberto Goldman: Fica Lula Próximo Texto: Painel do leitor Índice |
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