São Paulo, quinta-feira, 17 de julho de 2003 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES O PT, o mercado e o Estado
CESAR MAIA
Outra característica desse comportamento é o desprezo pela administração. A gestão governamental federal está à matroca, entregue a ninguém. O ministro Dirceu trata do que acha que é política, aviltando os partidos que despreza, seguindo a boa linha da esquerda tradicional -com um jogo muito mais cínico do que muitos jogos cínicos jogados pelo Executivo no Parlamento. O ministro da Fazenda se transforma em mero vocalizador -hábil, é bem verdade- do Banco Central. E a coordenação e gestão administrativas estão jogadas ao mar, à flutuação das iniciativas e humores de ministros que se dizem e se desdizem, tratam as políticas públicas a partir de suas visões pessoais e parciais. O presidente, por seu turno, tem muito mais horas de comícios diários do que de trabalho e gestão. Os ministros não despacham e os processos se acumulam. Num regime presidencialista, é inescapável a responsabilidade pessoal e direta do presidente, governador ou prefeito na gestão. Sem ela, a máquina anda ou pára ao sabor dos ventos e do noticiário. Esse desprezo pelo ato de governar é, na verdade, um desprezo pelo próprio Estado, que se desintegra na ausência de gerência. Essa facilidade em denegrir carreiras em nome de exceções, de desmoralizar as instituições, usando o mesmo apelo retórico contra rajás e marajás, é o desprezo do sindicalismo liberalista pelo setor público e suas instituições. A herança da qual tanto reclama o presidente, seu núcleo e seus acólitos, e que se traduz em taxas altas de juros, recessão etc., não é simplesmente herança do governo anterior. É herança do próprio PT e de sua forma de fazer política anterior, de sua retórica, de suas bravatas. A incerteza, que exige mais juros e mais recessão do que exigiria, é explicada pelo passado recente deles mesmos. Superado o susto -que alívio! O navio não vai afundar, diziam todos-, agora quer se saber para onde vai esse navio abastecido a aguardente, que gira em torno de si mesmo sem rumo. A carga tributária aumenta. O recurso à poupança externa está limitado. O MST avança. Os investimentos estrangeiros refluem. As instituições e as categorias que lhes dão sustentação tremem. A incerteza aumenta. Recomendo textos de política relacionados à Teoria da Catástrofe, de René Thom. Podem ensinar que os movimentos discretos, não tanto percebidos hoje, talvez sejam o terremoto de amanhã. E que a taxa de incerteza já subiu muito. Uma leitura atenta das pesquisas mostra isso. O governo já se esvai enquanto o presidente se equilibra -até quando?-, sem piso. Lembrando Getúlio: Não se faz política sem superfície de contato. Cesar Epitácio Maia, 58, economista, é prefeito, pelo PFL, do Rio de Janeiro. Foi prefeito da mesma cidade de 1993 a 1996. Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Flavia Piovesan: O STF e a diversidade racial Índice |
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