São Paulo, quinta-feira, 17 de julho de 2008

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CARLOS HEITOR CONY

O Rio e seus rios

RIO DE JANEIRO - "O Brasil não dá certo porque não tem um golfo." O diagnóstico é de Graciliano Ramos, em curiosa entrevista a Joel Silveira. Para corrigir a topografia nacional, propunha que se afundassem dois Estados litorâneos, Sergipe, terra de Joel, e Alagoas, terra do próprio Graça. O nome do novo acidente geográfico seria "Golfo das Alagoas".
Se falta um golfo ao Brasil, ao Rio de Janeiro falta exatamente um rio. Não sou eu que o digo, é M.J. Gonzaga de Sá, personagem de Lima Barreto, o mais carioca dos nossos escritores. Invocando sua condição de descendente de Estácio de Sá, fundador da cidade, Gonzaga repete em termos regionais o diagnóstico nacional de Graciliano Ramos.
Todas as grandes cidades são cortadas por rios importantes: Nilo, Tâmisa, Sena, Tibre, Vístula, Neva, Danúbio. Apesar do nome, o Rio tem alguns rios, mas não tem nada que preste. O rio Carioca, que deu nome ao morador da cidade, foi encanado. O Comprido nem chega a ser comprido nem chega a ser rio. O Maracanã é um filete de água que só existe quando há temporal e ameaça inundar o estádio homônimo.
Gonzaga sugeriu que se aproveitasse o Paraíba, que passa mais ou menos perto e tem bastante volume. Seria aberto um canal de alguns quilômetros, irrigaria uma porção considerável da Baixada Fluminense e desaguaria na avenida Rio Branco, cortando majestosamente o centro da cidade, despejando suas águas na praça Mauá, perto do nosso porto.
Aí fica a sugestão de M.J. Gonzaga de Sá. Ele se espantava com os funcionários do Ministério dos Cultos que procuravam determinar quantas flechas deviam ser cravadas na imagem de São Sebastião, padroeiro da cidade. E, segundo Lima Barreto, tinha uma imaginação muito plástica, "uma exatidão relativa mas criadora".


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