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CARLOS HEITOR CONY
O Rio e seus rios
RIO DE JANEIRO - "O Brasil não
dá certo porque não tem um golfo."
O diagnóstico é de Graciliano Ramos, em curiosa entrevista a Joel
Silveira. Para corrigir a topografia
nacional, propunha que se afundassem dois Estados litorâneos, Sergipe, terra de Joel, e Alagoas, terra do
próprio Graça. O nome do novo acidente geográfico seria "Golfo das
Alagoas".
Se falta um golfo ao Brasil, ao Rio
de Janeiro falta exatamente um rio.
Não sou eu que o digo, é M.J. Gonzaga de Sá, personagem de Lima
Barreto, o mais carioca dos nossos
escritores. Invocando sua condição
de descendente de Estácio de Sá,
fundador da cidade, Gonzaga repete em termos regionais o diagnóstico nacional de Graciliano Ramos.
Todas as grandes cidades são cortadas por rios importantes: Nilo,
Tâmisa, Sena, Tibre, Vístula, Neva,
Danúbio. Apesar do nome, o Rio
tem alguns rios, mas não tem nada
que preste. O rio Carioca, que deu
nome ao morador da cidade, foi encanado. O Comprido nem chega a
ser comprido nem chega a ser rio. O
Maracanã é um filete de água que só
existe quando há temporal e ameaça inundar o estádio homônimo.
Gonzaga sugeriu que se aproveitasse o Paraíba, que passa mais ou
menos perto e tem bastante volume. Seria aberto um canal de alguns
quilômetros, irrigaria uma porção
considerável da Baixada Fluminense e desaguaria na avenida Rio
Branco, cortando majestosamente
o centro da cidade, despejando suas
águas na praça Mauá, perto do nosso porto.
Aí fica a sugestão de M.J. Gonzaga de Sá. Ele se espantava com os
funcionários do Ministério dos Cultos que procuravam determinar
quantas flechas deviam ser cravadas na imagem de São Sebastião,
padroeiro da cidade. E, segundo Lima Barreto, tinha uma imaginação
muito plástica, "uma exatidão relativa mas criadora".
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