São Paulo, domingo, 17 de outubro de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

Grandeza e miséria

RIO DE JANEIRO - Não tenho certeza, mas foi em 1972 ou 1973, quando o barril do petróleo chegou a US$ 34, provocando uma crise mundial que por pouco não acabou numa guerra de verdade, com os produtores árabes pressionando politicamente os países do Ocidente, principalmente os mais industrializados.
Foi um deus-nos-acuda. Na Escandinávia, que não produz uma gota de petróleo, até os reis e rainhas passaram a andar de bicicleta. O Brasil quase deu a volta por cima, com o programa do álcool que substituiu temporariamente a gasolina. Mesmo assim, os postos fechavam aos sábados e domingos e muita gente ficou na estrada ao voltar do fim de semana.
Bem. Quer dizer, mal. O barril está hoje acima dos US$ 50 e parece que vai continuar subindo. Não há uma reivindicação específica no plano político, o terrorismo institucionalizado que se atribui a alguns países árabes faz estragos localizados e mais dramáticos. Pode-se concluir que o mundo ficou mais rico? É possível. Há mais gente, mais carros, mais consumo. Em compensação, há mais miséria. No caso do Brasil, naquele tempo a nossa produção de petróleo era insignificante, atualmente estamos chegando a um arremedo de autonomia no abastecimento.
Também não tenho certeza, mas, no embargo do petróleo do início dos anos 70, nossa população estava na faixa dos 90 milhões de brasileiros. Temos hoje quase o dobro de brasileiros e brasileiras. Ficamos mais ricos?
Em certo sentido, sim. Mesmo desprezando as taxas oficiais de crescimento, para um ignorante em economia, como eu, é fácil constatar a melhoria no padrão de vida. Independentemente dos governos que se sucederam, cavamos a vida para ter TV e geladeira nos barracos e favelas. Celular, quase todo mundo tem. Os bolsões de miséria também aumentaram, mas não por culpa do preço do petróleo. Culpa da concentração de renda, que também aumentou, tornando-se, como disse um ex-presidente, obscena.


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