São Paulo, terça-feira, 17 de outubro de 2006

Próximo Texto | Índice

Abater a dívida

Com setor privado dando mostras de apetite pelo risco, governo precisa controlar gasto e acelerar redução da sua dívida

O PRINCIPAL mecanismo utilizado pelos governos após o Real para ajustar as contas públicas foi a ampliação da carga tributária. O peso dos impostos saltou de 25,8% do PIB, em 1993 para 37,4% do PIB, em 2005. Essa expansão custeou superávits fiscais primários crescentes em um contexto de aumento das despesas correntes, sobretudo gastos com a Previdência -em razão do envelhecimento da população e da política de recuperação do salário mínimo.
Se esse arranjo evitou a explosão da dívida pública, demonstra dificuldade em reduzi-la do alto patamar em que se encontra -50% do PIB. O que é pior no endividamento público brasileiro, contudo, não é o tamanho do débito, mas seu perfil ruim (de curto prazo) e seu custo absurdo: seus encargos financeiros consumiram 8% de tudo o que foi produzido no país no ano passado.
Agora, uma conjunção de fatores vai abrindo uma nova oportunidade para que o governo abata seu passivo -melhorando o seu perfil e diminuindo o seu custo- com mais velocidade.
O mercado de capitais mostra sinais de dinamismo. Até outubro, as emissões de ações superam os R$ 27 bilhões, 60% acima do valor de 2005. Processo semelhante pode ser observado nos mercados de debêntures e de recebíveis (modalidades de dívida privada). O momento é um dos melhores em uma década para o mercado de capitais brasileiro. O setor imobiliário também dá sinais de recuperação, e as famílias ensaiam a contratação de financiamentos mais longos para a compra da casa própria.
A experiência e a doutrina econômica demonstram que a dívida pública tem condições de ser reduzida com mais vigor quando aumenta o apetite para o risco no setor privado. Embora em ritmo ainda incipiente, esse movimento de empresas e famílias em busca de mais crédito pode ser o prenúncio de uma virada no ciclo do endividamento no Brasil.
Juros básicos e inflação em queda e emprego e renda moderadamente ascendentes permitem projetar que esse cenário favorável à tomada de risco por agentes privados vá perdurar. Falta, no entanto, entrar em cena um elemento que potencialize os ganhos até aqui. Falta o setor público mudar o padrão do ajuste fiscal que tem prevalecido há mais de uma década e passar a controlar para valer as suas despesas, sem ataques adicionais ao bolso do contribuinte.
Colocar o pé no freio do gasto público -num contexto em que empresas e famílias demandam crédito- é criar uma oportunidade para a redução veloz da dívida pública. Significa ampliar o horizonte para a permanência do cenário de preços comportados e juros básicos cadentes. Significa abrir, em médio prazo, uma perspectiva concreta para a retomada dos dispêndios do Estado em infra-estrutura.


Próximo Texto: Editoriais: Sanções simbólicas

Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.