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TENDÊNCIAS/DEBATES
Incor e Fundação Zerbini
ADIB D. JATENE
As causas da crise financeira que ora enfrentam o Incor e a Fundação Zerbini
estão à vista de todos
A OPINIÃO pública tomou conhecimento da situação financeira do Incor e de sua fundação de apoio, a Fundação Zerbini.
Desde logo, precisa ficar claro que essa situação não se relaciona com irregularidades nem fraudes, mas, antes,
é conseqüência do desejo de colaborar com as autoridades constituídas.
A Fundação Zerbini, criada no final
dos anos 70, época em que se iniciava
a operação do Incor, se mostrou altamente eficiente para alavancar uma
instituição que honra a medicina brasileira e ajudou a colocar o país em paridade, tanto na área assistencial
quanto na de pesquisa e ensino, com
os países mais avançados do mundo.
E o fez com eficiência, acumulando
um fundo de reserva da ordem de R$
50 milhões, em 1995. Na expansão, o
governo iniciou a construção do bloco
2, interrompido após a conclusão da
estrutura de concreto. Esse esqueleto
atravessou duas administrações sem
que o Estado decidisse por sua conclusão. Foi quando a fundação, estimulada pelo governador Mário Covas, decidiu utilizar sua reserva financeira para concluir a obra.
Evidentemente, esperava-se que o
Estado adquirisse todo o equipamento e contratasse os funcionários, que
seriam apenas suplementados pela
fundação. Diante das dificuldades financeiras do Estado, impossibilitado,
até, de contrair empréstimos, a fundação decidiu assumir mais esse encargo, por meio de empréstimo do
BNDES, obtido com o apoio do governador Covas e negociado com a ajuda
do senador Piva, então presidente do
Conselho Curador da fundação.
Dessa maneira, não só terminou a
obra mas também adquiriu todo o
equipamento e a aparelhagem para
seu funcionamento -e assumiu os
gastos com a contratação de 1.503
funcionários que viabilizaram o funcionamento do bloco 2.
A inauguração festiva contou com
as presenças do governador do Estado e do presidente da República.
Estava deflagrado o processo que
levaria à crise financeira atual, por
decisão, hoje considerada equivocada, da própria fundação. Tendo assumido esses compromissos financeiros e precisando pagar os juros do financiamento, começou um processo
de déficit, financiado por empréstimos na rede bancária comercial, cujo
juro elevado agravou a situação.
Simultaneamente, em conseqüência do sucesso até então alcançado pelo Incor, começaram solicitações para
que a fundação participasse de outros
empreendimentos que, diziam, não a
onerariam financeiramente, mas utilizariam sua experiência no próprio
Incor e na gestão, entre outros, do
Projeto Qualis, na periferia de São
Paulo, com 56 equipes de saúde da família cuidando de perto de 250 mil
pessoas, que é superavitário.
Assim, entre outros, avulta o Incor
Brasília, que acabou exigindo desembolso da Fundação Zerbini, acumulando passivo significativo. De um lado, isso agravou a situação financeira
da fundação; de outro, permitiu que
se argüisse irresponsabilidade administrativa, fazendo com que ocorressem restrições às medidas capazes de
aliviar o problema financeiro.
De modo que, tanto internamente,
no âmbito do Hospital das Clínicas e
da Faculdade de Medicina da USP,
quanto externamente, nos níveis federal e estadual, se criou um clima
desfavorável à fundação, o que dificultou as medidas de auxílio, seja na
absorção pelo Estado dos funcionários pagos pela fundação, seja pelo reconhecimento do Estado em ajudar a
saldar os compromissos financeiros
conseqüentes da construção, equipamento e funcionamento do bloco 2.
As causas da crise financeira que
ora enfrentam o Incor e a fundação
estão à vista de todos. Um prédio com
a mais alta tecnologia hospitalar, uma
produção científica que conquistou
reconhecimento internacional e a
formação de material humano, não
apenas médico, que contribui para a
elevação do padrão técnico-científico
nacional. Ao lado disso, um volume de
atendimento de clientela do SUS sem
paralelo em qualquer hospital público, universitário ou não, neste país.
Diante da crise, a instituição tem
recebido manifestações de simpatia
tanto do governo federal quanto do
estadual. O presidente Lula determinou as medidas possíveis para refinanciamento pelo BNDES, suficientes para saldar os empréstimos com a
rede bancária comercial e pagar os
atrasados com fornecedores. O governador Lembo, pessoalmente, vem se
empenhando em conseguir agentes
financeiros para viabilizar o eventual
empréstimo do BNDES. Ao lado disso, medidas internas de reestruturação já em curso na instituição antecipam a superação dos problemas financeiros que preocupam a todos.
Ressalte-se que a instituição nunca
sofreu paralisação ou redução de suas
atividades -graças à consciência de
seus funcionários, cuja atuação, mesmo nessa crise que coloca em risco
seus empregos, tem sido exemplar.
ADIB D. JATENE, 77, cardiologista, é professor emérito
da Faculdade de Medicina da USP, diretor-geral do Hospital do Coração e membro do Conselho Consultivo da Fundação Zerbini. Foi ministro da Saúde (governos Collor e FHC), secretário da Saúde do Estado de São Paulo (governo Maluf) e diretor do Incor.
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