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CLÓVIS ROSSI
O roubo e o progresso
SÃO PAULO - No mundo todo,
900 milhões de pessoas acham que
os políticos são desonestos. Chocante, embora não propriamente
uma grande novidade.
É o que se infere da pesquisa batizada de "A Voz do Povo", feita pelo
Gallup International para o Fórum
Econômico Mundial, a entidade
que organiza, todo janeiro, os encontros de Davos.
O Gallup ouviu 61,6 mil pessoas
em 60 países, mas garante que os
resultados refletem o ponto de vista
de 1,5 bilhão de cidadãos. Como
60% deles dizem que os políticos
são desonestos, chega-se aos 900
milhões. Na América Latina são
mais: 77%. O Brasil não entrou na
pesquisa, mas acho que ninguém
duvida de que os resultados seriam
parecidos ou piores, dada a catarata
de escândalos que se sucedem governo após governo.
O que mais incomoda é que ainda
não se inventou outra maneira de
intermediação entre Estado e sociedade que não seja a política. Se os
seus agentes não são confiáveis,
tem-se um buraco institucional
gravíssimo. A propósito, apenas 8%
dos pesquisados no mundo confiam
nos políticos; na América Latina,
menos (4%).
De todo modo, parece que começa a haver crescente descolamento
entre a atividade política e o funcionamento do país. O Brasil é um
exemplo nítido: o Congresso é um
horror, a articulação Executivo/
Parlamento é atrapalhada, na melhor das hipóteses, e promíscua, na
pior, a ação do governo é claramente lenta e insuficiente, mas, mesmo
assim, a economia anda.
A Venezuela é outro exemplo:
79% de seus cidadãos acham os políticos desonestos, apenas 4% (metade da média mundial) confiam
neles, mas, não obstante, 55% esperam que a próxima geração será
mais próspera que a atual (muito
mais ou um pouco mais).
Leitura possível: enquanto os políticos roubam, o país progride. Até
quando, no entanto?
crossi@uol.com.br
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