São Paulo, terça-feira, 18 de abril de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Gravatazeiros


Há uma ligação forte entre desenvolvimentistas e políticos populistas. O discurso de ambos é imediatista

ROBERTO LUIS TROSTER

Os gravatazeiros , pássaros ameaçados de extinção, não existem no resto do mundo e só sobrevivem em algumas regiões do interior da Bahia e de Minas Gerais. A degradação da caatinga e da mata Atlântica fez com que o número dessas aves se reduzisse drasticamente. Sua perpetuação é de interesse de muitos e é motivo de celebração.
Os desenvolvimentistas estão em extinção, não existem no resto do mundo e só sobrevivem em algumas regiões do Brasil e de alguns países vizinhos. O baixo crescimento das economias que seguiram seus preceitos e o bom desempenho dos países que perseveraram em políticas responsáveis fizeram com que o número desses economistas se reduzisse drasticamente. Sua perpetuação é de nenhum interesse e é motivo de preocupação.
Há uma ligação forte entre os gravatazeiros e o gravatá, espécie de bromélia terrestre. Há uma ligação forte entre os desenvolvimentistas e os políticos populistas. O discurso de ambos é imediatista. As propostas são reduções rápidas de juros, altas artificiais do câmbio e elevações aceleradas de gastos públicos, que impulsionam a economia a curto prazo e cativam os incautos. A médio e longo prazo, o resultado é mais concentração de renda, taxas de crescimento baixas e juros reais elevados.
Seu receituário é o seguinte tripé: aumento do déficit fiscal, metas de inflação flexíveis e administração imediatista do câmbio.
Uma elevação de gastos públicos tem um impacto positivo na economia ao gerar uma alta da demanda. O problema é que seu financiamento é feito ou mediante mais impostos, ou por meio de um crescimento da dívida pública, aumentando os juros para toda a economia. Resumindo, um crescimento agora ocasionando uma retração maior no futuro.
O segundo apoio do tripé é a lassitude com as metas de inflação. Uma elevação da inflação estimula a atividade econômica tirando renda dos que recebem preços -leia-se "assalariados"- e transferindo aos que fixam preços -leia-se "empresários". Concentra a renda e desestimula investimento para aumentar os lucros, pois se ganha mais com a remarcação de preços. A evidência empírica é contundente, não há um exemplo sequer de crescimento sustentado com inflação.
O terceiro pé é uma elevação artificial do câmbio, com a compra de divisas, incentivando exportações pelo efeito preço. A barreira é o custo fiscal alto, pois se gastam recursos vultosos para adquirir reservas internacionais, além do desestímulo a investimentos em produtividade. Funciona enquanto o custo fiscal puder ser financiado e o efeito preço não exigir mais desvalorizações. Uma política que não se perpetua.
O tripé de políticas desenvolvimentistas foi aplicado no Brasil e em seus vizinhos nas últimas décadas do século passado. O resultado foi desastroso: bolhas de crescimento seguidas de crises. A conseqüência é que a renda per capita média latino-americana, que correspondia a 35% da dos países da OCDE há 25 anos, atualmente é de apenas 20% e permanece concentrada. Lastimável!
Os desenvolvimentistas debatem com fantasmas, contrapõem suas idéias às de monetaristas, ortodoxos e outras correntes de pensamento ultrapassadas, sem defensores.
Em contraposição, o crescimento sustentado tem como condição necessária o tripé oposto ao dos desenvolvimentistas: responsabilidade fiscal, comprometimento com metas de inflação e câmbio flexível. As outras condições são as que propiciam a geração de riquezas, em vez de sua apropriação. Estão baseadas em três pilares: pessoas, empresas e infra-estrutura.
O pilar mais importante para o crescimento sustentado são as pessoas. A riqueza de uma nação é feita por gente que, quanto mais capacitada estiver, mais poderá contribuir e usufruir. A educação é a prioridade em qualquer política de desenvolvimento consistente. O segundo pilar são as empresas. Há obstáculos contra a produção que têm que ser superados: simplificar e diminuir a tributação, racionalizar a burocracia, flexibilizar a contratação de mão-de-obra etc. Quanto mais fácil for produzir riquezas, mais rico será o país.
A infra-estrutura é o terceiro pilar. Para crescer, é necessária uma infra-estrutura adequada em todas as suas dimensões: física (estradas, telefonia etc.), social (protegendo os desfavorecidos), institucional (execução de contratos, definição clara de direitos etc.) e de segurança (pessoal e legal).
O cenário atual é apropriado para aplicar políticas duradouras. A inflação está em baixa, as taxas de juros estão em queda, as exportações estão altas, as contas públicas controladas e a economia está blindada. É um quadro adequado para que a economia brasileira deslanche de forma consistente.
Os gravatazeiros estão sendo preservados, pelo esforço de ambientalistas, no interior da Bahia. O crescimento sustentável depende do esforço de toda a sociedade brasileira exigindo uma política econômica responsável. Não há esperança nos desenvolvimentistas.


Roberto Luis Troster, doutor em economia pela USP, professor titular do departamento de economia da PUC-SP, é o economista-chefe da Febraban (Federação Brasileira dos Bancos).
@ - troster@febraban.org.br


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