São Paulo, terça-feira, 18 de maio de 2010

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Força da natureza

Com biografia incomum e amplo reconhecimento, a candidata Marina Silva representa a reciclagem da política verde no Brasil

O LANÇAMENTO da candidatura da senadora Marina Silva à Presidência é um sinal de amadurecimento das propostas ambientais no país.
Em 1986, a fundação do Partido Verde refletia, no Brasil, um movimento da política europeia. No final dos anos 1970, militantes pacifistas e ex-simpatizantes de organizações de esquerda, frustrados com os rumos teóricos e práticos do socialismo, encontraram na causa ecológica uma nova perspectiva de militância radical.
Tratava-se, àquela altura, de contrapor-se à ameaça nuclear e ao modo como o desenvolvimento técnico e industrial era concebido tanto no Ocidente quanto na esfera de influência soviética. Não por acaso, a versão brasileira do PV nasceu da iniciativa de ex-exilados políticos, ligados à luta armada, que viram de perto a experiência da Europa.
Sem envergadura para voos próprios, o partido e os primeiros simpatizantes das teses verdes acabaram por se tornar uma espécie de ornamento ecológico das agremiações de centro-esquerda -como o PSDB e, sobretudo, o PT. A identificação entre reivindicações ambientalistas e militância petista não era difícil de acontecer num país marcado por conflitos fundiários e desigualdades na economia rural.
Propostas como reforma agrária, apoio à agricultura familiar e preservação das florestas facilmente enquadravam-se na lógica primitiva do confronto entre representantes arcaicos do poder agrário, habituados a seguir sua própria lei, e a massa de despossuídos do campo, submetida a condições precárias, quando não sub-humanas, de vida.
O país no entanto mudou. Não superou as assimetrias e não se tornou um perfeito exemplo de equilíbrio nas relações entre economia e natureza. Mas certamente avançou em diversos aspectos e adquiriu um tipo mais sofisticado e amplo de entendimento da questão ambiental.
Da mesma forma que na Europa o movimento verde abandonou posições isolacionistas, dispôs-se a fazer política e conseguiu atrair o apoio de governos e empresas, no Brasil, a sociedade vai se habituando à pauta ambiental como algo que não diz respeito apenas a esta ou àquela área ou doutrina.
É o que a candidata Marina Silva, com seu léxico característico, costuma chamar de "transversalidade". Sua presença na disputa eleitoral, depois de atritos com o que se poderia chamar de "desenvolvimentismo de alto carbono" do governo Lula, na figura da tocadora de obras Dilma Rousseff, representa a reciclagem da proposta verde no Brasil.
Pela biografia incomum e pelo reconhecimento que conquistou, Marina reúne condições de obter apoio de empresários, encampar bandeiras como a reforma do Estado e influenciar a agenda das demais candidaturas.
Seja qual for o resultado da eleição, não poderá ser ignorada. Terá, ao menos, exercido papel relevante para retirar a política ambiental de seu antigo gueto.


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