|
Próximo Texto | Índice
Editoriais
editoriais@uol.com.br
Força da natureza
Com biografia incomum e amplo reconhecimento, a candidata Marina Silva representa a reciclagem da política verde no Brasil
O LANÇAMENTO da candidatura da senadora
Marina Silva à Presidência é um sinal de
amadurecimento das propostas
ambientais no país.
Em 1986, a fundação do Partido Verde refletia, no Brasil, um
movimento da política europeia.
No final dos anos 1970, militantes pacifistas e ex-simpatizantes
de organizações de esquerda,
frustrados com os rumos teóricos e práticos do socialismo, encontraram na causa ecológica
uma nova perspectiva de militância radical.
Tratava-se, àquela altura, de
contrapor-se à ameaça nuclear e
ao modo como o desenvolvimento técnico e industrial era concebido tanto no Ocidente quanto
na esfera de influência soviética.
Não por acaso, a versão brasileira
do PV nasceu da iniciativa de ex-exilados políticos, ligados à luta
armada, que viram de perto a experiência da Europa.
Sem envergadura para voos
próprios, o partido e os primeiros simpatizantes das teses verdes acabaram por se tornar uma
espécie de ornamento ecológico
das agremiações de centro-esquerda -como o PSDB e, sobretudo, o PT. A identificação entre
reivindicações ambientalistas e
militância petista não era difícil
de acontecer num país marcado
por conflitos fundiários e desigualdades na economia rural.
Propostas como reforma agrária, apoio à agricultura familiar e
preservação das florestas facilmente enquadravam-se na lógica primitiva do confronto entre
representantes arcaicos do poder agrário, habituados a seguir
sua própria lei, e a massa de despossuídos do campo, submetida
a condições precárias, quando
não sub-humanas, de vida.
O país no entanto mudou. Não
superou as assimetrias e não se
tornou um perfeito exemplo de
equilíbrio nas relações entre
economia e natureza. Mas certamente avançou em diversos aspectos e adquiriu um tipo mais
sofisticado e amplo de entendimento da questão ambiental.
Da mesma forma que na Europa o movimento verde abandonou posições isolacionistas, dispôs-se a fazer política e conseguiu atrair o apoio de governos e
empresas, no Brasil, a sociedade
vai se habituando à pauta ambiental como algo que não diz
respeito apenas a esta ou àquela
área ou doutrina.
É o que a candidata Marina Silva, com seu léxico característico,
costuma chamar de "transversalidade". Sua presença na disputa
eleitoral, depois de atritos com o
que se poderia chamar de "desenvolvimentismo de alto carbono" do governo Lula, na figura da
tocadora de obras Dilma Rousseff, representa a reciclagem da
proposta verde no Brasil.
Pela biografia incomum e pelo
reconhecimento que conquistou, Marina reúne condições de
obter apoio de empresários, encampar bandeiras como a reforma do Estado e influenciar a
agenda das demais candidaturas.
Seja qual for o resultado da
eleição, não poderá ser ignorada.
Terá, ao menos, exercido papel
relevante para retirar a política
ambiental de seu antigo gueto.
Próximo Texto: Editoriais: Bomba demográfica
Índice
|