São Paulo, segunda-feira, 18 de junho de 2007

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Precedente perigoso

Supremo diz que Lei de Improbidade não afeta cargos do primeiro escalão, mas posição ainda pode ser revista

O SUPREMO Tribunal Federal (STF) acaba de tomar uma decisão que, se mantida, dará novo e mais amplo significado ao termo "impunidade".
Por seis votos a cinco, os ministros estabeleceram que a Lei de Improbidade Administrativa (nš 8.429/92) não pode ser aplicada contra o ex-ministro da Ciência e Tecnologia (1999-2002) Ronaldo Sardenberg, que usou avião oficial para viagem a passeio.
O problema, evidentemente, não está no turismo aéreo ministerial. A questão é grave porque ela abre o precedente para que outras autoridades de primeiro escalão do país denunciadas com base na Lei de Improbidade -cerca de 10 mil ações nas contas do Ministério Público- peçam -e obtenham- a anulação de seus processos.
Para o Supremo, os chamados agentes políticos -ocupantes de cargos de primeiro escalão- não estão sujeitos à Lei de Improbidade porque já podem responder a processos por crime de responsabilidade (lei nš 1.079/50) e são passíveis de perda do cargo. Esse universo abrange o presidente e o vice-presidente da República, ministros de Estado, ministros de Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas da União, o procurador-geral da República, o advogado-geral da União, os comandantes das Forças Armadas, governadores, prefeitos e secretários de Estado e municipais.
A prevalecer essa interpretação, a Lei de Improbidade se aplicaria apenas aos ocupantes de cargos de segundo escalão para baixo ou servidores de carreira do Estado. E há uma distância considerável entre os dois diplomas legais. A legislação que trata de crimes de responsabilidade prevê a pena de perda do cargo, por decisão parlamentar ou em foro privilegiado. Contam-se nos dedos os casos em que isso ocorreu na história recente.
Já a Lei de Improbidade estabelece perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, multa civil e ressarcimento dos cofres públicos. Mais importante, determina que os processos tramitem na primeira instância da Justiça, permitindo o julgamento antes da prescrição.
A situação só não é pior porque existe a tendência de o Supremo rever essa posição. É que o julgamento de Sardenberg se arrasta desde 2002 e, dos seis votos vencedores, três são de ministros que já se aposentaram. A nova composição da corte poderá oferecer outra interpretação aos próximos casos. Os substitutos dos três aposentados deram nesta semana indícios de que são favoráveis à Lei de Improbidade.
Ao STF cabe o papel de guarda da Constituição. Isso significa que seus ministros devem estar também atentos aos princípios básicos da Carta, como o da moralidade da administração pública, definido pelo artigo 37. Nesse contexto, está errado excluir do escopo da Lei de Improbidade Administrativa os principais administradores do país.


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