São Paulo, sexta-feira, 18 de agosto de 2006

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NELSON MOTTA

Uma dupla do barulho

RIO DE JANEIRO - Usando apenas seu carisma e sua história, sua dialética e sua fabulosa capacidade de convencimento, José Dirceu conseguiu formar e manter a base aliada do governo Lula no Congresso sem recorrer a mesadas, jabás, cargos e empregos. Só no papo, na arte da articulação política, fazendo a ponte entre os interesses -sempre legítimos, claro- do empresariado produtivo, do Estado solidário e do partido do povo. Realidade ou ficção?
Sem fazer qualquer juízo de valor, que grande personagem é esse "Zé Dirceu"! Quase tão bom quanto "Lula, de-operário-a-presidente" -o sonho de qualquer ficcionista. Foram feitos um para o outro, são opostos e se completam. Na polêmica se teria sido demitido por Lula ou se teria pedido demissão, Dirceu diz que sua posição era resistir. Botar os movimentos sociais e a militância nas ruas e reagir ao plano da elite conservadora, ao complô da direita para desestabilizar o governo popular.
Não foi o que concluíram a Polícia Federal, a CPI e o procurador-geral da República, mas é só um detalhe. O que vale é a intenção, é imaginar Zé Dirceu, Genoino, Silvinho e Delúbio, em cima de um tanque, desfraldando bandeiras brasileiras e do PT, gritando palavras de ordem e marchando sobre Brasília à frente de uma coluna de blindados, seguidos por multidões de excluídos.
Mas Lula não topou. Dirceu é o guerreiro romântico, o galã intelectual revolucionário. Lula é feioso, conservador e careta, nunca foi de esquerda, tem horror a intelectual e a revolução, é da paz e da negociação, sindicalista treinado em conseguir o melhor para seus colegas.
Assim como Dirceu, Lula acha que, se o deixarem falar, convence qualquer um de qualquer coisa. Até que os dois não têm nada a ver com tudo o que aconteceu.


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